Não é só por aqui! Ex-secretário de Alckmin teria transformado a pasta em escritório de advocacia

Ricardo Salles pediu demissão da secretaria do Meio Ambiente de São Paulo um dia após o Ministério Público ter distribuído o processo em que ele é investigado por, supostamente, transformar a pasta em uma “advocacia administrativa” que fazia interlocução com autoridades públicas. Fundador do “Endireita Brasil”, Salles ainda é investigado por fraudes e atos de improbidade administrativa

A saída de Ricardo Salles da secretaria estadual do Meio Ambiente de São Paulo não foi à toa. Oficializada no último dia 25, a demissão do advogado foi anunciada em uma carta enviada ao governador Geraldo Alckmin (PSDB),em que diz que sua “missão foi cumprida” e que “é chegada a hora” de retornar às suas atividades no setor privado.

Acontece um evento em específico, um dia antes, pode ter sido determinante para a sua demissão. No último dia 24, foi distribuído no Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo um processo em que Salles, junto com seu ex-secretário adjunto, Antonio Velloso Carneiro, são investigados por “crimes contra a paz pública” e “quadrilha ou bando”.

De acordo com o Ministério Público Estadual, o ex-secretário teria transformado a pasta em uma advocacia administrativa em que a esposa do então secretário adjunto, Brunna Alves Carneiro, assinava as petições, e Antonio Velloso Carneiro e Ricardo de Aquino Salles atuavam na interlocução com autoridades públicas. O escritório está em nome de Brunna Alves Carneiro e seu marido, Antonio Velloso Carneiro. Mesmo Ricardo Salles não estando no contrato social, no entanto, o MP acredita que ele seja um dos donos do escritório.

“Ricardo Aquino Salles, mais conhecido como RICARDO SALLES, no período que intermediou sua saída da função de secretário particular do governador Geraldo Alckmin e a assunção do cargo de Secretário Estadual do Meio Ambiente, teria sido contratado pela empresa BUENO NETO para exercer a atividade de “interlocutor” desta junto a órgãos e funcionários públicos incumbidos de analisar questões de seu interesse (…) Embora a representação não deixe explícito, fornece elementos para se suspeitar de que a assunção do cargo de Secretário Estadual do Meio Ambiente por RICARDO SALLES, esteja relacionada à mesma função que sempre desempenhou, qual seja, “interlocutor” do grupo Bueno Netto”, diz trecho do resumo do caso elaborado pelo MPE.

Esse é só mais um dos esquemas em que Ricardo Salles supostamente estaria envolvido. Direitista fervoroso – ele é um dos fundadores do grupo “Endireita Brasil” -, o advogado acumula inquéritos civis por improbidade administrativa ao mesmo tempo em que ostenta luxos nas redes sociais, como quando posta fotos de seus barcos. Apesar da vida de “patrão”, Salles, que já foi secretário particular de Alckmin, quase foi preso, em 2014, por não pagar pensão alimentícia aos filhos.

Entre os processos, o agora ex-secretário é réu em uma ação civil pública em que é acusado de alterar a proposta de plano de manejo da Área de Proteção Ambiental da Várzea do Rio Tietê de maneira arbitrária. Ele também é investigado por ter dado andamento a uma proposta de negociação do imóvel da sede do Instituto Geológico, na Capital e, em outro inquérito, Salles é investigado ainda por ter realizado chamamento público, sem autorização legislativa, para a concessão ou venda de 34 áreas do Instituto Florestal. Entre técnicos e ambientalistas, o ex-secretário do Meio Ambiente é tido como autoritário e tomador de decisões monocráticas sem o devido aval de especialistas.

Confira, abaixo, a íntegra do resumo do MPE sobre o caso.

Pelo que consta dos documentos juntados, Ricardo Aquino Salles, mais conhecido como RICARDO SALLES, no período que intermediou sua saída da função de secretário particular do governador Geraldo Alckmin e a assunção do cargo de Secretário Estadual do Meio Ambiente, teria sido contratado pela empresa BUENO NETO para exercer a atividade de “interlocutor” desta junto a órgãos e funcionários públicos incumbidos de analisar questões de seu interesse.

Para instruir as alegações constantes na representação, foram juntadas cópias de procedimento disciplinar perante órgão especial do Tribunal de Justiça de São Paulo (autos 2270253-73.2015.8.26.000) no qual se apurou irregularidades na atuação do Dr. Ulysses de Oliveira Gonçalves Júnior, juiz de direito, que teria sido contatado por RICARDO SALLES para interceder junto ao Dr. Guilherme Madeira Dezém, juiz da 44.ª Vara Ovel da C.apital para que o recebesse.

Segundo consta, ao telefonar para o Dr. Guilherme, o Dr. Ullisses teria noticiado que RICARDO SALLES seria um advogado ligado ao governo do Estado, o que fez com que o primeiro o recebesse, acreditando que fosse a respeito de alguma decisão de interesse coletivo que havia proferido.

Ocorre que o interesse de RICARDO SALLES consistia em obter informações sobre um processo que tramitaria perante a 44.ª Vara Cível da Capital, na qual o grupo BUENO NETIO buscava a anulação de uma sentença arbitral, que o havia condenado a pagar elevadíssima importância em dinheiro à empresa SPPATRIM.

Consta ainda, na representação, cópia da portaria de inquérito civil 74/2016 (doe. 47) na qual se apura a prática de crimes de improbidade administrativa praticados por RICARDO SALLES, dentre outros, visando beneficiar o grupo Bueno Netto que atua na construção civil.

Na portaria e questão, bem como nas informações prestadas pelo pelo contábil Rodney Ramos (doe. 29), consta a notícia de que nos autos, posteriormente remetidos à 9.ª Vara Criminal Federal (crimes contra o sistema financeiro nacional e lavagem de dinheiro por representantes do grupo BUENO NETIO), foi solicitada a realização de um laudo pericial contábil.

O perito supra foi encarregado de realizá-lo, o que fez com brevidade, uma vez que a requisição se deu em 29/06/2015 e a conclusão, em 21/ 07/ 2015.

Em razão da celeridade da realização da perícia em questão, RICARDO SALLES, ainda “interlocutor” do grupo BUENO NETIO representou o perito perante a Corregedoria de Polícia.

A pressão exercida por RICARDO SALLES contra o perito Rodney Ramos, deu-se no mesmo contexto em que este passou a receber ligações de um outro perito lotado em outro núcleo do IC – que dizia irmão do Delegado Corregedor de uma loja maçônica – que exigia uma retratação do laudo desfavorável aos interesses da BUENO NETIO, pois do contrário “usariam” toda a máquina para fazer sua cabeça rolar.

As ligações eram frequentes, chegando a dez por dia.

O inquérito em questão foi avocado pela Corregedoria da Polícia quando então se determinou que o perito Rodney Ramos complementasse a perícia, com a observação de que fizesse “uma nova e moderada análise de todo o conteúdo documental”.

Por conta das sucessivas pressões e ameaças contra o perito, o fato foi levado ao conhecimento do Judiciário, que determinou uma Comissão Técnica de Análise e Estudo do laudo pericial, concluindo pela perfeição deste.

Há notícias nos autos de que dois delegados que atuaram no feito supra foram afastados.

Além das informações supra, nos documentos noticiados na mídia, há referências à suspensão de licenças ambientas expedidas pela Cetesb quanto ao megaempreendimento denominado “Parque Global”, realizado pelo grupo BUENO NETTO. Embora se tratasse de um único empreendimento, não houve estudo prévio de impacto ambiental e a expedição de uma única licença, mas ao contrário, várias, considerando cada uma delas, prédios isolados que formariam o complexo do parque.

Em matéria jornalística juntada na mídia que acompanha a representação, questiona-se o fato de RICARDO SALLES, pessoa sabidamente ligada ao Grupo BUENO NETTO, ter assumido a Secretaria de Estado do Meio Ambiente, sob cujo comando encontra-se justamente a Cetesb, cujas licenças suspensas beneficiavam dolosamente ou não, o grupo.

Também consta a notícia de que o jornal Folha de Dourados teria publicado matéria relacionada ao afastamento de delegados no inquérito remetido à 9.ª Vara Criminal Federal e ainda, que perante a Receita Federa l havia expediente visando apurar o súbito enriquecimento de RICARDO SALLES.

Uma funcionária da Secretaria do Meio Ambiente, Jéssica de Almeida Baldoni teria contatado o jornal para a remoção da reportagem (docs. 36/40) Há notícias ainda, através de redes soc1a1s quanto ao súbito enriquecimento de RICARDO SALLES, ostentado através de viagens e aquisição de um iate.

Embora a representação não deixe explícito, fornece elementos para se suspeitar de que a assunção do cargo de Secretário Estadual do Meio Ambiente por RICARDO SALLES, esteja relacionada à mesma função que sempre desempenhou, qual seja, “interlocutor” do grupo Bueno Netto.

Todos os fatos noticiados já foram apurados em inquéritos e processos judiciais, mas até onde se tem notícia, não especificamente em relação ao crime de advocacia administrativa.”

Anexo a manifestação do MPE na íntegra.

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Fonte Revista Forum