Lado escuro da força! Condenados a 70 anos por estupro e homicídio, delegados vão para presídio

Os delegados da Polícia Civil Eder Oliveira Moraes e Fernando Araújo da Cruz Júnior, que foram condenados pela Justiça pelos crimes de estupro e furto de cocaína, no caso do primeiro, e de homicídio, no caso do segundo, foram transferidos de cela especial da 3ª DP (Delegacia de Polícia Civil) de Campo Grande para o Centro de Triagem Anísio Lima, também na Capital, onde cumprirão o resto da pena que somadas dão mais de 70 anos de reclusão.

A transferência ocorreu apenas quatro meses após a condenação de Fernando da Cruz, ex-titular da Deaji (Delegacia Especializada de Atendimento à Infância, Juventude e Idoso) de Corumbá, a 20 anos e 10 meses de prisão pela execução do boliviano Alfredo Ranger Weber dentro de uma ambulância, em fevereiro de 2019. Já por estupro de vulnerável, Eder Oliveira cumprirá 37 anos de prisão em regime fechado, além de outros 14 anos e 7 meses de pena pelo “sumiço” de 101 quilos de cocaína da delegacia em que atuou, em Aquidauana em junho de 2019.

Além disso, foi determinada pela Justiça a perda do cargo de delegado, considerando que “Eder estava envolvido com grupo criminoso e utilizou de sua posição para facilitar o furto da droga”. Em março deste ano, ele foi demitido da Polícia Civil. Ele é o personagem central da história descoberta no dia 10 de junho de 2019, quando se percebeu que os 100 quilos de cocaína ‘sumiram’ misteriosamente da delegacia.

Em uma delação premiada feita à Corregedoria da Polícia Civil, os comparsas do delegado, a advogada Mary Stella e seu marido, Ronaldo Alves de Oliveira, revelaram detalhes de como foi organizado todo o processo para a retirada da droga da delegacia. No documento, Mary Stella revela que o delegado Eder a chamou, logo após a apreensão da droga que foi depositada no prédio da delegacia.

Ele pediu para que ela checasse com seu marido Ronaldo o valor do quilo da cocaína no mercado, já que o homem conheceria compradores. Ainda segundo o depoimento, Eder teria combinado com o casal o valor de R$ 100 mil para que o plano fosse colocado em prática. A cocaína apreendida estava sendo negociada com terceiros e a suspeita é que a droga pertencia ao grupo criminoso que ‘perdeu’ o carregamento durante a batida da PRF.

Decidido a colocar o plano em prática, o delegado Eder apresentou para Mary Stella detalhes do prédio da delegacia e registros fotográficos de pontos ‘frágeis’ do local foram feitos por ela. Eram locais onde câmeras de segurança não filmavam, os conhecidos ‘pontos cegos’. As fotos foram enviadas pela advogada para o celular do marido.

Conversas de WhatsApp, do dia 11 de junho de 2019, mostram transferências bancárias feitas para a conta de Mary Stella. O dinheiro era depositado na conta da advogada para que não ficasse registrada a entrada de valores na conta do delegado Eder, que por sua vez recebia o dinheiro até em sacolas de perfumes entregues pela advogada a ele.

Com o mapeamento da delegacia pronto, era a hora de escolher os dias para a subtração da droga. A decisão foi retirar o carregamento do prédio em duas etapas. Os dias escolhidos para o ato criminoso foram aqueles em que estaria de plantão um policial conhecido por ‘ter medo’ de averiguar barulhos que escutava no pátio da delegacia.

Com tudo arquitetado, o delegado Eder pediu para que Ronaldo e Mary Stella contratassem alguém para poder executar o furto e entrar na delegacia pelos fundos para invadir o depósito. O próprio delegado, conforme a delação premiada, foi quem quebrou a alavanca de uma das janelas da delegacia, o que facilitaria a retirada da cocaína que estava em sacos transparentes armazenados em prateleiras. Uma escada foi usada para que os comparsas contratados pudessem pular o muro de 2,5 metros e entrar no local.

Mas, o plano que parecia ser perfeito, acabou caindo por terra por um erro. Tudo começou quando um carro Toyota Corolla que levaria a droga da delegacia acabou passando em frente ao prédio. No local, havia câmeras de segurança que flagraram o veículo. Para o primeiro dia de retirada da cocaína da delegacia, foram contratados dois presos do semiaberto. Eles receberam cada um R$ 10 mil pelo trabalho, e um deles acabou comprando uma motocicleta no valor de R$ 8 mil.

Porém, como foram penalizados no semiaberto por não se apresentarem no horário marcado, a situação poderia levantar suspeitas e eles acabaram ficando de fora do segundo dia de retirada da droga, que aconteceu na madrugada de domingo para segunda, em 10 de junho, dia em que se descobriu o furto da droga.

Na segunda retirada da cocaína, foram cerca de 30 minutos entre a invasão no prédio, o furto da cocaína e a saída, sendo que o embarque da droga no Corolla demorou cerca de 40 segundos. A cocaína seria substituída por pacotes de cal e a ideia era que ninguém percebesse a troca, já que a incineração da droga estava marcada para dali algum tempo.

Corumbá

Já no caso de Fernando da Cruz, o boliviano Alfredo Weber foi esfaqueado em uma festa e depois socorrido, sendo levado de ambulância para Corumbá. Então, o delegado interceptou a ambulância e o matou a tiros antes de chegar ao hospital. No entanto, o delegado, achando que não havia testemunhas do crime, foi pego de surpresa quando foi informado pelo investigador da Polícia Civil, Emmanuel Contis, de que a irmã da vítima estava na ambulância e viu o assassinato.

Em meio a toda a trama do homicídio, testemunhas foram coagidas — uma delas o motorista da ambulância, que teve como advogada a mulher de Fernando da Cruz, Silvia. O que o casal não esperava era que policiais bolivianos e até um promotor usassem de chantagem para extorquir os dois, com pedido de R$ 100 mil para que não implicassem o delegado ao assassinato. Na tentativa de encobrir os rastros do crime até as execuções dos policiais e delegados que estavam investigando o caso, foi arquitetada por Fernando e Emmanuel, que informavam ao delegado todos os passos das investigações.

O delegado ainda estaria ligado ao tráfico de drogas, já que ele e a mulher estariam em contato com Fernando Limpias, que já havia trabalhado para Adair José Belo, mais conhecido como “Belo”, e para Sérgio de Arruda Quintiliano, o “Minotauro”, que foi preso em Santa Catarina, no dia 4 de abril. Fernando Limpias estaria comprando fazendas, com pista de pouso, na Bolívia para o transporte de drogas e estava à procura de “parcerias”.

Silvia, então, teria oferecido a ‘parceira’ através da logística de reabastecimento dos aviões. Nas conversas com o traficante, é perceptível o domínio do assunto tanto pelo delegado como por sua mulher. A defesa do delegado negou as acusações sobre envolvimento com o tráfico de drogas. Assim, Fernando e Emmanuel foram presos em 29 de março, em ação da DEH (Delegacia Especializada de Homicídios) e Garras (Delegacia Especializada em Repressão a Roubos a Banco, Assaltos e Sequestros). Com informações do site Midiamax