Denúncias de assédio, racismo e roubos têm provocado as expulsões dos motoristas de aplicativos

Levantamento feito pelo site Campo Grande News junto às Varas Cíveis de Campo Grande e divulgado nesta segunda-feira (22) revela que as expulsões de motoristas de aplicativos das plataformas em operação no município são motivadas por denúncias de racismo, assédio sexual, grosseria, tortura, roubo e estelionato.

Os profissionais são confrontados com irregularidades e, alguns, até tentam provar inocência na Justiça, mas acabaram vencidos pelo argumento da liberdade contratual, usado pelas empresas. A reportagem encontrou 52 processos que tramitam na Justiça da Capital e tem como parte as plataformas que atuam na cidade, figurando como réus ou autores.

Dos 52, pelo menos 26 foram protocolados por motoristas que se sentiram lesados ao serem suspensos e/ou bloqueados por duas empresas: a Uber do Brasil Tecnologia Ltda e a 99Pop. Dessas 26 ações, 19 tramitam contra a Uber, empresa de tecnologia com um milhão de motoristas e 22 milhões de passageiros no Brasil.

Uma delas é de motorista de 41 anos, que trabalhou por 3 anos utilizando a plataforma da Uber. No dia 24 de setembro deste ano, teve a conta encerrada, sob alegação de ter cometido assédio. Pediu que a empresa apresentasse boletim de ocorrência e pagasse R$ 27,8 mil por danos morais, lucros cessantes e indenização.

Na defesa, a empresa apresentou os prints de denúncias feitas por usuários da plataforma. Em um deles, a passageira se disse constrangida com as investidas dele, dizendo que ela era “muito bonita e gostosa”. Em outro caso, o motorista de 27 anos, ingressou com ação em dezembro de 2021, questionando o motivo da conta ter sido cancelada após sete meses de trabalho.

O rapaz contestou a alegação apresentada a ele, de que teria cancelado, em um mês, 2.241 corridas, média de 74 por dia, sendo “humanamente impossível”. Na ação, a assessoria jurídica da Uber, além de alegar o cancelamento excessivo, apresentou print de passageira, reclamando da atitude dele. “Me senti humilhada, mesmo pagando, me senti como estava me fazendo um favor (…) Cara estúpido!”.

No processo protocolado em novembro de 2021 por motorista, de 47 anos, a reclamação é que foi bloqueado após 4 anos e 5 meses de trabalho. Alegou que não teve chance de se defender e pediu a reintegração da conta, além de ser indenizado em R$ 57,905 mil por danos morais e materiais. A empresa apresentou três prints do sistema de comunicação com passageiros, em que demonstrariam a má conduta: em um deles, é acusado de ter deixado jovem com espectro autista, menina de 12 anos e criança de 2 anos em endereço diferente do pedido, às 23h, além de ter cobrado o dobro do valor da corrida. Em outras duas ocasiões, estaria embriagado e chamou passageiro de macaco.

Além das reclamações dos passageiros, tanto a Uber quanto a 99pop apresentaram como justificativa uma das piores infrações cometidas, a de motoristas acusados por crime e que respondem a processos penais. É o caso do motorista de 44 anos, aposentado da Polícia Civil, que havia se cadastrado na Uber em 2017. Em novembro de 2019 pediu que a plataforma liberasse o acesso para que trabalhasse em Florianópolis (SC). No dia seguinte, foi bloqueado pela empresa, sob alegação de que era réu em processo de tortura.

A defesa do motorista alegou que o processo de tortura, ainda em tramitação, foi distribuído em 24 de julho de 2018, um ano após a checagem de dados feita pela plataforma, ocorrida em 2017. “A Requerida antecipou-se em condená-lo, em flagrante violação ao princípio do estado de inocência, insculpido na Carta Magna do Brasil”. Pela 99 pop, há três ações em tramitação em Varas Cíveis de motoristas que foram bloqueados justamente por esta infração.

Outro caso é de um motorista de 33 anos, descredenciado em abril de 2021, sem informação do motivo. No processo, consta que foi decorrente de ação por estelionato, de 2020. Dos processos avaliados contra a Uber e a 99 pop, a reportagem encontrou argumentos semelhantes usados pelos motoristas: a de que não tiveram direito ao contraditório e sofreram danos financeiros com a suspensão. Por isso, pediram inversão do ônus da prova e recorreram ao Código do Consumidor para contestar a quebra de contrato.

Dos 12 que já tiveram sentença, 10 foram favoráveis às empresas e apenas dois tiveram decisão parcialmente procedente aos motoristas, como a reintegração no aplicativo e pagamento de R$ 5 mil por danos. Das 10 ações improcedentes, o juiz, além de levar em conta a maioria das provas apresentadas, também acatou o principal argumento das empresas: o do princípio da liberdade contratual, previsto no artigo 421 do Código Civil.

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