Medicina do crime! Novas evidências apontam vínculos do PCC e a Universidade do Paraguai

Após a prisão do criminoso brasileiro Weslley Neres dos Santos, 34 anos, mais conhecido como “Bebezão”, apontado como um dos líderes da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital) na fronteira do Paraguai com Mato Grosso do Sul, a Polícia Federal do Brasil e a Senad (Secretaria Nacional Antidrogas do Paraguai) estão investigando uma lista em que pelo menos 50 estudantes dos cursos de Medicina na fronteira podem ser integrantes do grupo.

Nesta segunda-feira (05), novas evidências das ligações entre a Universidade Central do Paraguai (UCP) e criminosos da facção criminosa brasileira surgiram após a prisão de Cleverson Portelli, considerado um dos principais dirigentes da facção, capturado na semana passada por agentes federais brasileiros em Ponta Porã (MS). Portelli vestia uma camiseta da UCP (curso de medicina), além de haver outros uniformes da universidade no local da batida, o que mostraria que a citada casa de “estudos” serve para encobrir e proteger criminosos brasileiros perigosos, dizem fontes de inteligência.

Cleverson Portelli, vulgo “Tubarão do PCC”, foi capturado no dia 31 de março durante operação realizada por agentes da Delegação Especial para Repressão a Crimes de Fronteira (DEFRON) e do Setor de Investigações Gerais (SIG) do Brasil Polícia Civil, no Bairro Jardim Residencial I, em Ponta Porã. No momento da apreensão, Portelli vestia uma camiseta azul, uniforme da carreira de Medicina da Universidade Central do Paraguai, o que leva à suspeita de que seja um dos muitos “alunos” da referida universidade.

Portelli estava acompanhado de outro sujeito, identificado como Gabriel M., vulgo “Zulu”. Eles também tinham armas de fogo, dinheiro, boletos de cocaína e uma quantidade de maconha em sua posse. Além disso, estavam na residência várias camisetas (uniformes) da Universidade Central do Paraguai, dirigidas pelo brasileiro Aparecido Karlos Bernardo, que, segundo fontes da Inteligência Antinarcóticos e seu próprio ex-sócio, também seria integrante do PCC.

A relação “especial” entre a UCP e o PCC foi revelada dias atrás, com a captura de Weslley Neres dos Santos, vulgo “Babe” ou “Baby”, na cidade de Pedro Juan Caballero. É acusado de ser um dos dirigentes do PCC e portador de credencial da UCP, assinada por Karlos Bernardo, onde consta que Dos Santos foi aluno regular do primeiro ano da carreira de Medicina da UCP.

Em comunicado redigido integralmente em português, a UCP tentou refutar as acusações, que acusam a universidade de oferecer cobertura ao crime organizado, mas com a captura de Cleverson Portelli o “elo” entre a referida universidade e o PCC, facção criminosa em franca expansão em nosso país.

Lembremos que Rosa María Dávalos, ex-sócia de Aparecido Karlos Bernardo, que aparece como “diretora administrativa” da UCP, denunciou publicamente que ele próprio vivia rodeado de “pistoleiros” e que estava envolvido com a máfia pedrojuanina. Ele até o acusa de ser o autor moral de pelo menos dois atos de assassinato contratado.

Também o prefeito de Pedro Juan Caballero, José Carlos Acevedo, havia afirmado que Karlos Bernardo é um grande rude “que veio a nossa cidade para vender diplomas universitários aos seus compatriotas brasileiros. Quem faz Karlos Bernardo pensar em ameaçar meio Pedro Juan, porque ele é escoltado por pistoleiros. De que tem medo este senhor de Deus? ”, Questionou o chefe da comunidade pedrojuanino.

Apesar de tudo isso, a justiça de nosso país permanece até o momento em sugestivo silêncio sobre o caso da UCP, que conseguiu “legalizar” suas atividades acadêmicas com manobras bastante duvidosas, perante o Conselho Nacional de Ensino Superior (CONES) e a Agência Nacional para a Avaliação e Acreditação do Ensino Superior (ANEAES). Acredita-se que políticos locais influentes estejam fornecendo proteção e cobertura a Karlos Bernardo e seus capangas, permitindo-lhe operar com total impunidade no Paraguai.

 

Investigação

Segundo a PF, a nova artimanha usada pelo PCC para levar membros ao país vizinho foi descoberta com a prisão de “Bebezão”, ocorrida no último dia 23 de março, junto com outros 14 comparsas, sendo 8 deles paraguaios. Estavam nos fundos de um lava-jato de fachada da quadrilha, há tempos investigado pelas autoridades dos dois países. Ao todo, foram apreendidos na ação 11 veículos, 6 fuzis automáticos, grande quantidade de munições e coletes à prova de bala.

Ao se identificar aos paraguaios, “Bebezão” mostrou uma carteira de acadêmico da Universidad Central del Paraguay. E, de fato, ele estava matriculado na filial de Ciudad del Este, distante 420 quilômetros de Pedro Juan Caballero, cidade paraguaia que faz fronteira com Ponta Porã (MS) e onde ele foi preso. O criminoso entrou no começo do ano passado, menos de um mês após ganhar a liberdade provisória da Penitenciária de Presidente Venceslau (SP), que abriga a cúpula do PCC.

Ele suspendeu a matrícula já no segundo semestre, quando as aulas estavam suspensas por conta da pandemia. Voltou, contudo, no início deste ano. Na avaliação da PF, pouco importava para “Bebezão” as aulas para ser médico. Importava, sim, ter um álibi para circular livremente no país vizinho na função de líder da facção. De acordo com os agentes paraguaios, ele se passava por estudante de Medicina para poder circular livremente no país e negociar remessas de drogas na fronteira para o PCC.

“Neste ano, ele mesmo apresentou os documentos e se matriculou novamente na sede de Ciudad del Este. É um aluno ativo e participa das aulas on-line”, afirmou Alfredo Duarte, advogado da instituição de ensino, por e-mail. Sobre a carteirinha de identificação apreendida com “Bebezão”, o defensor afirmou que, assim como em qualquer instituição de ensino, assim que se matriculam, todos os alunos recebem um documento igual. “Se ele é membro de um grupo criminoso, que está além da universidade determinar, cabe às autoridades investigar”, acrescentou.

O problema é que “Bebezão” não é um caso isolado. A Senad divulgou durante o fim de semana que realizará uma devassa nas matrículas dos cerca de 1,5 mil brasileiros estudantes de Medicina no Paraguai para descobrir outros filiados. A PF acredita que cerca de 50 deles são membros ativos do PCC e têm suas contas estudantis bancadas pela quadrilha. Isso conforme listas de despesas apreendidas no lava-jato. A polícia paraguaia diz que os outros detidos também circulavam pela instituição de ensino e chegaram a ser reconhecidos por alunos brasileiros, que admitiram ter contatos mínimos com eles.

Policiais federais brasileiros apontavam “Bebezão” como o então número 1 na chefia da facção paulista no Paraguai. Ele assumiu o comando desde que Giovanni Barbosa da Silva, conhecido como “Bonitão”, foi detido, em 9 de janeiro deste ano, também em Pedro Juan Caballero. De acordo com os policiais brasileiros, um outro integrante do PCC já foi escalado para chefiar os negócios da facção na região no dia 29 de março.

O novo nome, já identificado, está sob sigilo. A advogada Zylly Rolón, secretária-executiva da Senad, afirmou para rádios paraguaias que o grupo tinha histórico de participar de roubos a bancos no Brasil e de atacar transportadoras no Paraguai. “Estavam muito interessados em assalto a bancos”, disse.