O título apareceu pela primeira vez em 2012, no artigo “Privatização, ainda que tardia” de Salles para a Folha de S.Paulo. Depois, foi incorporado ao seu currículo e era citado nas emissoras de TV onde ele dava entrevista. No entanto, ao entrar em contato com a universidade norte-americana – uma das mais bem conceituadas do mundo, onde estudaram cinco presidentes norte-americanos e 12 vencedores do Prêmio Nobel – o site The Intercept descobriu que Salles nunca esteve entre os alunos.
“A informação de 2012 foi veiculada erroneamente, por um equívoco da assessoria. De qualquer modo, desde então, vem sendo sempre corrigida, exatamente como bem relatou o Roda Viva em sua nota”, escreveu Salles no Twitter, em resposta a uma internauta que o questionou. Salles foi entrevistado no programa Roda Viva, da TV Cultura, no último dia 11 de fevereiro e o título de mestre em Direito Público por Yale chegou a ser divulgado pela emissora. A produção do programa se manifestou sobre o assunto por meio de nota.
“O programa Roda Viva, da TV Cultura, informa que o Sr. Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, não fez veicular dados incorretos, tendo alertado previamente a produção acerca da imprecisão das informações que foram erroneamente divulgadas pelo programa. Pedimos desculpas ao Sr. Ministro pelo inconveniente causado”, diz o comunicado.
O ministro do Meio Ambiente divulgou a nota em seu perfil e aproveitou para atacar o The Intercept por ter tornado pública a incorreção em seu currículo. “A diferença do bom jornalismo da TV Cultura para o jornalixo que certos sites e blogs sensacionalistas praticam com sua militância esquerdista disfarçada de fake news”, escreveu.
Currículos mentirosos
O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, usa ternos bem cortados, óculos com aros de tartaruga, relógios caros, sabe conjugar verbos e costuma acertar o uso do plural. Destoa, portanto, de seus colegas de Governo e, sobretudo, de seu chefe, cuja eloquência não resiste a mensagens de áudio de mais de um minuto no Whatsapp.
Membro de uma família de advogados de São Paulo, graduado em Direito, tinha credenciais e physique du rôle adequados ao pedigree de “mestre em Direito Público em Yale”, informação presente na assinatura de seus artigos desde 2012. Segundo texto publicado no site Intercept, porém, o ministro jamais frequentou a prestigiosa universidade americana.
A assessoria de comunicação de Yale foi consultada e revelou desconhecer o rastro do ilustre estudante. Salles ainda não se pronunciou sobre o caso. Mas essa linha garbosa em seu currículo tem toda pinta de cascata. Não é a primeira desse tipo no governo Bolsonaro. A titular do ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, declarou-se mestre em Educação, Direito Constitucional e da Família.
Questionada pela Folha de S.Paulo sobre a origem do diploma, voltou atrás e se disse mestre “no sentido de que são mestres todos os que interpretam a Bíblia.” O governo Bolsonaro não inventou o currículo mentiroso. Nos anos petistas, a praxe também vicejava.
A própria Dilma Rousseff foi pega no pulo em 2009, ainda como ministra, ao se declarar mestre em Economia pela Unicamp. Ela tinha cursado algumas disciplinas, mas não chegou a defender a dissertação. Também o chanceler Celso Amorim declarava na página do Itamaraty ser doutor pela London School of Economics. Assim como Dilma, cursara algumas disciplinas, mas não defendeu a tese.
Ricardo Salles, jovem, com sua ambição por holofote e vaidade de paulistano bem-nascido, poderia representar alguma reserva de seriedade intelectual desse governo, quem sabe até uma ponte com um setor do empresariado e do mercado financeiro que tem dificuldade de engolir a jequice de Bolsonaro, ainda que comungue de seus valores. Mas não é preciso ter estudado em Yale para notar que ele não vai por esse caminho.