Juiz impõe mais 180 dias de tornozeleira para delegado que continuar dando aula de tiro na academia

O juiz Roberto Ferreira Filho, da 1ª Vara Criminal de Campo Grande, acatou o pedido do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) para a renovação da monitoração por tornozeleira eletrônica para o delegado Marcio Shiro Obara e também para Lucimar Calixto Ribeiro, mais conhecido como “Mazinho”, por mais 180 dias. Os dois foram presos durante a 3ª fase da “Operação Omertà” e viraram réus por recebimento e pagamento de propinas, respectivamente.

O Gaeco aponta como gravíssimos os crimes cometidos por Obara e Mazinho, lembrando que o delegado responde por corrupção passiva e obstrução à Justiça. Também reafirma que o delegado, então titular da DEH (Delegacia Especializada de Homicídios), apurava as execuções de Ilson Martins Figueiredo, Alberto Aparecido Roberto Nogueira, o “Betão”, e do policial civil Anderson Celin Gonçalves da Silva.

Para impedir o avanço das investigações, Obara teria recebido valor indevido, para “blindar” líderes da organização criminosa. O delegado ainda teria recebido R$ 100 mil para “segurar” a investigação da morte de Figueiredo. Para o Gaeco, a autoridade policial, em exercício da profissão, deu proteção criminosa a líderes da organização.

Mazinho, por sua vez, é apontado como responsável pelo pagamento de valores indevidos aos agentes da Segurança Pública do Estado. Ou seja, era quem fazia o pagamento de propina aos agentes. Ele também foi denunciado por exercer função de motorista, segurança e gerente dos funcionários que trabalhavam na casa de um dos investigados.

Aulas de tiro

Em prisão domiciliar desde o dia 7 de agosto do ano passado, o delegado de Polícia Civil Márcio Shiro Obara obteve do juiz Roberto Ferreira Filho, da 1ª Vara Criminal de Campo Grande, a autorização para ministrar as aulas da disciplina “Armas, Equipamentos e Tiro Policial” do curso da Acadepol/MS (Academia de Polícia Civil de Mato Grosso do Sul).

O fato seria cômico, se não fosse trágico, afinal, o delegado foi preso durante a 3ª fase da “Operação Omertà” por corrupção passiva, obstrução de Justiça e lavagem de dinheiro para a milícia armada comandada pelos empresários Jamil Name e Jamil Name Filho, ambos presos desde o dia 27 de setembro de 2019.

A incoerência é brutal, pois como a Justiça pode autorizar um réu, que está em prisão domiciliar e usando tornozeleira eletrônica, a ministrar aulas em um curso de formação de policiais civis, cuja disciplina é o manuseio de arma de fogo e tiro?

Na decisão, o juiz Roberto Ferreira Filho até tenta amenizar, pois proíbe o contato do delegado Márcio Obara com armas de fogo fora da “sala de aula”. Porém, o que impede o réu de tentar usar a arma de fogo a qual terá acesso durante o curso para fugir ou cometer algum outro ato ilícito?

O magistrado também autorizou o pleito da defesa do delegado Márcio Obara para que o período fora do recolhimento domiciliar do réu seja estendido até as 21h30, inclusive aos sábados, para que possa lecionar no referido curso na sede da Acadepol até o dia 15 de abril de 2021.

A decisão do juiz Roberto Ferreira Filho vai contra o posicionamento do MPE (Ministério Público do Estado), que pediu para que o magistrado indeferisse o pedido. Para o magistrado, o pleito busca possibilitar que o requerente exerça atividade laboral e diz entender “que o requerimento é razoável, já que até mesmo as penas privativas de liberdade encontram limite nos fundamentos da dignidade humana como acesso a trabalho ou acesso à educação”.

Ao MPE, o juiz declara que, “mesmo que este Juízo tenha proibido a utilização de armas de fogo em suas atividades, como pontuaram os zelosos promotores de Justiça, entendo que tal proibição pode ser excepcionada, de forma exclusiva, para que o requerente possa lecionar no curso de formação, tendo em vista os motivos expostos pelo diretor da Acadepol/MS”.

O magistrado ainda completa que “Márcio Shiro Obara continuará impedido de manusear armas de fogo fora das aulas da Acadepol/MS”. “Outrossim, deve-ser ter sempre em destaque o princípio da provisionalidade, que possibilita a revisão/revogação das medidas cautelares, até mesmo de ofício pelo Juízo”, pontuou na decisão.