A falta de preparo dos militares do Exército veio à tona de forma trágica nesta semana em Campo Grande (MS). Um sargento da 9ª Companhia de Guardas do Exército jogou álcool em gel no rosto de um recruta de apenas 18 anos e ateou fogo em uma espécie de trote, provocando queimaduras no pescoço, nas costas e no rosto da vítima.
Porém, a brincadeira de mau gosto não passou desapercebida pela família do soldado que acionou a Justiça para processar o militar, apesar de o CMO (Comando Militar do Oeste) ter aberto um inquérito policial militar para apurar os fatos. O incidente entre o sargento e o recruta ocorreu no dia 23 de março, apenas 20 dias depois de o jovem ser integrado à corporação.
Segundo o relato em investigação, o sargento provocou os ferimentos, jogando álcool em gel no rapaz e acendendo a chama de um isqueiro. Para a defesa do jovem, o fato pode ser enquadrado desde crime de lesão corporal dolosa até tortura.
A descrição feita em depoimento pelo recruta é de que, assim que o isqueiro foi aceso pelo sargento, entrou em “combustão”. Apesar disso, só foi levado para o Hospital Militar de Campo Grande três dias depois, em 26 de março, quando o comandante da unidade soube do episódio.
Antes disso, os outros militares envolvidos convenceram o recruta a não contar o que aconteceu. Ele chegou a dizer ter sofrido queimaduras do sol, mas foi interpelado por outro sargento, alertando-o que mentir poderia trazer complicações para ele mesmo.
O sargento que ateou fogo no colega foi colocado para fazer apenas serviços administrativos, segundo a reportagem constatou. Há também dois soldados envolvidos diretamente, conforme o depoimento do jovem, e mais três que ouviram gritos e são considerados testemunhas.
Pelo depoimento do recruta, ele estava fazendo o trabalho de faxina na unidade, quando passou a ouvir um dos militares envolvidos o chamando de “Greg”, em referência a personagem da série “Todo Mundo Odeia o Cris”.
Demorou a entender que era para ele e quando isso aconteceu, recebeu ordens dos “superiores”. Deveria procurar um isqueiro e trazer para o sargento sob acusação de provocar os ferimentos. Disse ter buscado o objeto e, quando o entregou ao outro militar, foi mandado que se abaixasse, um “líquido gelado” foi espirrado sobre ele e escutou a frase: “Se eu riscar esse isqueiro, pega fogo?”
Diante do recruta em chamas, a situação exposta é de desespero, com os militares em volta dando tapas para apagar o fogo. Tentou-se, conforme as informações obtidas, solução “caseira”, passando pomada para tatuagens e por meio de telefonema pedindo ajuda para o pai de um dos recrutas, que é enfermeiro.
Na mesma noite, o rapaz foi levado apenas ao posto médico local. Nesse dia, ouviu de colegas que era melhor não revelar o que havia acontecido. Desistiu só quando outro sargento desconfiou da afirmação de ter sido vítima de queimaduras de sol.
Foi aí que a família foi acionada, ele foi levado ao Hospital Militar e medicado. Recebeu a recomendação de não fazer atividades que demandam esforço físico nem se barbear ou ficar ao sol. Inconformados, os pais buscaram ajuda de advogados.
Além de acompanhar o andamento das investigações na esfera militar, os defensores do recruta vão entrar com processo pedindo indenização à União. A família informa que o soldado está muito abalado emocionalmente com a situação e está fazendo acompanhamento psicológico. O rapaz “tinha o sonho de servir o Exército Brasileiro, assim como seu irmão que é soldado do efetivo profissional em outra organização militar.