MPF pede a condenação do ex-desembargador Divoncir Maran por mandar soltar narcotraficante

O subprocurador-geral da República José Adonis Callou de Araújo Sá deu parecer favorável à condenação do desembargador aposentado Divoncir Schreiner Maran, do TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul), pela suspeita de ter recebido propina para conceder habeas corpus ao narcotraficante Gerson Palermo, condenado a 126 anos de prisão no regime fechado.

A aposentadoria compulsória por ter completado 75 anos de idade no dia 6 de abril deste ano não interrompe o procedimento no CNJ (Conselho Nacional de Justiça), que poderá mudar a aposentadoria do magistrado de compulsória para aposentadoria-sanção e deixar registrada na ficha do magistrado a condenação por ter soltado um bandido de alta periculosidade.

A procedência no CNJ pode complicar a situação penal de Divoncir Maran. A Polícia Federal pediu o seu indiciamento pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. No entanto, a ministra Isabel Gallotti, do Superior Tribunal de Justiça, optou por encaminhar o inquérito para uma das varas criminais da Justiça estadual em Campo Grande e não analisou o pedido.

Sem foro especial, o desembargador aposentado deve ser condenado pelo CNJ, conforme parecer do MPF. Ele se gaba de nunca ter uma mancha na ficha funcional ao longo de 43 anos como magistrado em Mato Grosso do Sul.

“Em face do exposto, o parecer do Ministério Público Federal é pela procedência da imputação formulada no processo administrativo disciplinar, com a aplicação da sanção de aposentadoria compulsória com vencimentos proporcionais ao magistrado requerido”, solicitou o subprocurador-geral da República José Adonis Callou de Araújo Sá.

Conforme o MPF, Divoncir Schreiner Maran teve conhecimento do habeas corpus antes dele ser distribuído ao seu gabinete e orientou os funcionários, o chefe de gabinete, Fernando Carlana, que tinha o token para assinar as decisões do desembargador, e Gabriela Soares Moraes, que elaborava as minutas, para conceder a prisão domiciliar ao chefão do PCC, mediante o uso de tornozeleira eletrônica.

“Apesar de não existir uma hierarquia formal entre os assessores do requerido, as provas de natureza documental e testemunhal a seguir analisadas demonstram que, à época dos fatos, Fernando Carlana coordenava as atividades do gabinete, tinha contato direto com o magistrado e transmitia suas orientações aos servidores, bem como assinava as minutas de decisão com o certificado digital do requerido”, pontuou o subprocurador-geral da República José Adonis Callou de Araújo Sá.

“A testemunha acrescentou que o HC nº 1404522-80.2020.8.12.0000 foi protocolado às 18h34 e distribuído às 21h42, sendo que, nesse interregno, a tela encaminhada pelo magistrado a Fernando Carlana, posteriormente repassada para Gabriela Soares Moraes, somente poderia ser acessada por quem tivesse o perfil de distribuição, não sendo comum que os desembargadores o possuíssem. Não há nos autos notícias de que o requerido ou seu assessor tivessem o referido perfil”, destacou o MPF, sobre o depoimento de Éder Gilson da Silva Vargas, responsável pela distribuição dos processos no TJMS.

Gabriela Soares Moraes informou à Polícia Federal que havia supressão de instância, mas não foi ouvida. Ela até diz para Bob, como Fernando é conhecido, de que teria realizado uma “gambiarra” para soltar Palermo e acatar a determinação de Divoncir Maran.

No mesmo plantão, no dia 19 de abril de 2020, o desembargador negou um habeas corpus sob a alegação de supressão de instância. Ou seja, ele ignorou uma regra do Judiciário apenas para conceder HC ao narcotraficante.

“Comprovou-se que a execução da assinatura da decisão foi feita pelo servidor que conhecia a senha do requerido e utilizava seu token, caracterizando-se uma indevida delegação de ato personalíssimo do julgador, suficiente a abalar a segurança jurídica necessária à prestação jurisdicional. A aprovação da minuta pelo magistrado não tornou regular a prática adotada e tampouco afastou a manifesta negligência de sua conduta, correspondente a uma inaceitável terceirização da jurisdição”, lamentou.

A defesa de Divoncir negou que houve irregularidade. “A decisão ora sob análise consubstancia ato jurisdicional, assemelhada a milhares de outras proferidas nas mesmas condições com fundamento na Recomendação CNJ nº 62/2020, abarcada, portanto, pela independência funcional garantida aos magistrados no exercício da atividade judicante”, explicou.

“Não havia como prever o rompimento da tornozeleira e a fuga do paciente”, afirmou, sobre a fuga misteriosa do narcotraficante. “A demora no exame do pedido pelo juízo de 1º grau caracterizou negativa de prestação jurisdicional, suficiente a justificar a atuação em segunda instância”, justificou, sobre a supressão de instância.

“A urgência do pedido de liminar, a situação da COVID e a Recomendação CNJ nº 62/2020 fundamentaram a necessidade de análise no plantão”, pontuou. “A periculosidade do paciente e supostas inverdades contidas na inicial do habeas corpus não eram de seu conhecimento à época da decisão”, minimizou, sobre a folha corrida de Palermo, que incluiu o sequestro de um avião. Com infos site O Jacaré