Com 57 execuções desde janeiro até o início deste mês de junho, a região de fronteira do Paraguai com Mato Grosso do Sul é uma verdadeira terra sem lei, onde quem manda são as facções criminosas brasileiras PCC (Primeiro Comando da Capital) e CV (Comando Vermelho), responsáveis por uma guerra pelo controle do tráfico de drogas e de armas.
Em entrevista ao site Campo Grande News, o ex-superintendente da Polícia Federal no Estado, delegado federal aposentado Edgar Paulo Marcon, revela um pouco do poder dessas facções criminosas nessa região fronteiriça. Ele revel que PCC e CV são os responsáveis pelos piores atos de violência cometidos contra pessoas que praticam o bem.
Especialista em segurança, Edgar Marcon foi superintendente da PF em Mato Grosso do Sul de 2011 a 2015 e conhece bem a realidade da fronteira. “As facções são responsáveis pelas piores violências cometidas contra a maioria que defende o bem. Seja pelas ações organizadas de tráfico de substâncias ilícitas, contrabando, assaltos a bancos e carros fortes, assassinatos, corrupção e, o pior de todos, a cooptação de jovens que dependem muito mais de ações sociais do estado do que da polícia”, afirmou.
Para o delegado federal aposentado, a execução do “Rei da Fronteira”, o narcotraficante Jorge Rafaat Toumani, no dia 15 de junho de 2016, em Pedro Juan Caballero, cidade paraguaia que faz fronteira com Ponta Porã (MS), não fez aumentar o número de mortes na região. “A violência atual não é muito diferente do passado e que o ponto fora da curva é justamente a presença das facções”, justificou.
Ele relata que a disputa pelo poder à bala, assassinatos por acerto de contas ou queima de arquivo na fronteira sempre ocorreram, inclusive com Jorge Rafaat. “Dizer que ele era melhor ou pior destes que aí estão é partir de uma premissa falsa. O que se sabe é que Rafaat estava preocupado com a chegada dessas facções à fronteira pelo simples fato de temer concorrência em suas empreitadas criminosas. Ou seja, seus até então clientes passaram a querer disputar mercado”, avaliou.
O diferencial das organizações atuais, conforme Edgar Marcon, é a quantidade de mão de obra barata composta por pessoas marginalizadas e de fácil descarte pelo grupo, cuja ascensão ocorre devido ao caráter violento que possuem. “Quando um ‘chefe’ tomba, surge outro em seu lugar quase automaticamente para dar prosseguimento às empreitadas criminosas”, analisou.
Sobre o aumento na apreensão de drogas na fronteira, ele afirma que isso decorre do trabalho mais atuante das forças públicas associado ao aumento da oferta com a maior produção das drogas. “Em relação à cocaína e derivados, deve-se ao aumento da produção da droga, principalmente e com apoio estatal na Bolívia. A maior oferta de maconha ocorre quando os programas de erradicação no Paraguai não são seguidos de acordo com termos assinados com o Brasil via Policia Federal e com o Paraguai via Senad (Secretaria Nacional Antidrogas)”, argumentou.
Diante das recentes execuções na Capital, o ex-superintendente da PF destaca que é preciso analisar alguns aspectos. “Primeiro: os atuais assassinatos com armamento de guerra, como fuzis de alto poder, não se diferem de outros que ocorreram aqui em Campo Grande num passado recente. O diferencial está somente no calibre. Então, diria que continua tudo na mesma, ou seja, ações que, apesar de assustadoras, não têm reflexo direto na segurança exercida e direcionada à população em geral por tratarem-se se de pontuais e relacionadas por problemas internos nas organizações. Outro aspecto preocupante são os assaltos em via pública e residências, pequenos furtos ou roubos cometidos por pequenos marginais, que, não agem com a sofisticação das organizações apesar de, em muitos casos, agirem em decorrência delas. Causam mais danos diretos ao cidadão”, analisou.
Sobre o cenário atual, Edgar Marcon reconhece que o trabalho da segurança é hercúleo devido, em parte, às leis demasiadamente “garantistas”. “Aqui, todos têm o direito de cometer um crime pelo menos e, até a condenação não transitar em julgado – regra e não exceção – o indivíduo está apto a cometer outros. Mas, o que se faz e com o que se tem, produz bons resultados. Uma segurança deficitária sempre será melhor que sua ausência”, reforçou.
A respeito do uso das forças do Exército Brasileiro na região, ele é contra e ressalta que a soberania nacional está longe de ser ameaçada. “Em tempo de paz, e em um País onde a democracia e as instituições estão íntegras e integradas, o controle de fronteiras é ação dos órgãos de segurança pública, onde as forças armadas não se enquadram. Apesar de termos uma extensa fronteira seca no Estado, quem conhece, sabe que são poucas as rodovias por onde tudo passa e que dão acesso aos outros estados. Portanto, capacidade de atuar nossas forças públicas possuem. O que falta é mais investimento em recursos materiais e pessoais na fronteira para formação de equipes de barreiras fixas e móveis que juntamente com a inteligência policial realizada nos grandes centros trarão à população uma maior tranquilidade”, finalizou.