A maior etapa da Lava Jato em número de presos está completando um ano de duração com avanços limitados na Justiça e ainda sem localizar um grupo de réus foragidos, inclusive o seu principal alvo. Em 3 de maio de 2018, a Polícia Federal deflagrou a “Operação Câmbio, Desligo”, desdobramento da investigação no Rio de Janeiro que mirava uma rede de operadores financeiros responsável por movimentar ilegalmente quantias bilionárias.
A etapa tinha o maior número de mandados de prisão preventiva, com 49 deles expedidos, em uma só fase da operação. O principal alvo era Dario Messer, conhecido como “doleiro dos doleiros”, que também tinha cidadania paraguaia. Na época, tinha a expectativa de que esse novo braço da investigação desvendasse outros ‘fronts’ da lavagem de dinheiro no país ainda fora do radar da força-tarefa de Curitiba. De lá para cá, porém, os investigadores tiveram reveses com decisões do Judiciário e um saldo de escasso andamento do processo aberto na primeira instância.
Além disso, apesar de cooperação internacional e buscas no Paraguai, Messer e ao menos cinco alvos até hoje não foram encontrados pelas autoridades brasileiras. Quase todos os presos de um ano atrás, hoje, estão fora da cadeia. Foram ao menos dez solturas determinadas pelo ministro Gilmar Mendes, do STF (Supremo Tribunal Federal), e outras quatro do STJ (Superior Tribunal de Justiça).
Em alguns casos, a iniciativa partiu do próprio juiz Marcelo Bretas, na primeira instância. Dois dos suspeitos já morreram. A primeira denúncia da “Câmbio, Desligo”, contra 62 pessoas, foi apresentada em junho do ano passado, listando dezenas de diferentes frentes de lavagem de dinheiro sujo no país e clientes na política. Juiz da Lava Jato no Rio, Bretas recebeu as acusações, mas teve que desmembrar partes por causa dos réus não encontrados, e até agora os processos andam com lentidão.
Em fevereiro, o juiz se manifestou sobre o assunto nos autos: “É notório que a demanda vem se prolongando por prazo superior ao esperado, diante da necessidade de diligências, a fim de se conferir às defesas total acesso aos elementos probatórios que embasaram a denúncia”, traz a matéria. A “Câmbio, Desligo” foi deflagrada a partir da delação de uma dupla de doleiros, Vinicius Claret e Claudio Souza, conhecidos como Juca Bala e Tony, presos no Uruguai em 2017 na esteira das investigações contra o ex-governador do Rio Sérgio Cabral (MDB).
Entre seus alvos dessa fase da Lava Jato fluminense, havia nomes já conhecidos das autoridades de outras operações famosas contra evasão de divisas no país, como o caso Banestado. As idas e vindas da Câmbio, Desligo desde a sua deflagração incluem decisões de habeas corpus favor de réus que estavam foragidos. Foi o caso de Ernesto Matalon, que chegou a pagar R$ 2 milhões em espécie como fiança para conseguir a liberação. Bretas chegou a determinar o pagamento de fianças multimilionárias, com base nos valores suspeitos movimentados, mas Gilmar criticou essa iniciativa e fixou, por exemplo, pagamento de R$ 5 milhões para o foragido Richard van Otterloo.
Na último dia 11, um doleiro suspeito de ser o braço direito de Messer, Bruno Farina, recebeu habeas corpus do STJ apenas três meses após ser preso. Ele estava foragido e foi localizado no final de dezembro no Paraguai, no mesmo condomínio onde Messer vivia, na fronteira com o Paraná. Sua prisão e extradição foi anunciada como uma grande vitória pelas autoridades paraguaias. Agora, terá que cumprir medidas cautelares no Rio, como o uso de tornozeleira eletrônica.
Enquanto isso, Messer continua a ser uma dor de cabeça para o país vizinho, onde tem empresas suspeitas de lavagem de dinheiro e ligação próxima com o ex-presidente Horacio Cartes, que já o chamou de “irmão de alma”. Apontado por Juca Bala e Tony como “doleiro de doleiros”, responsável por estruturar uma rede de pagamentos ilegais para outros cambistas, Messer teve os bens bloqueados no Paraguai.
Apesar de foragido, o doleiro assinou uma procuração em novembro, em um cartório paraguaio, que outorgava poderes para sua advogada no país, Leticia Bóbeda, agir em processos civis. No Brasil, ele é representado por José Augusto Marcondes de Moura Jr., que ano passado disse que ele estava disposto a negociar as condições de se apresentar. Agora, afirma que irá esperar obter habeas corpus de tribunais superiores para se apresentar. O pedido, que ainda não foi protocolado, seria feito como extensão de outro habeas corpus. “Vamos tentar soltar ele sem ter a foice da prisão preventiva”, diz o advogado.
Apesar das dificuldades, a força-tarefa do Ministério Público no Rio considera positivo o saldo da operação e afirma que novos acordos de colaboração vão proporcionar novas etapas de investigação. Mais sistemas eletrônicos de pagamentos ilegais estão sendo periciados pelos investigadores. “As informações são complementares e se cruzam. É questão de tempo para a gente fechar esse círculo”, diz o procurador Eduardo El Hage, coordenador da Lava Jato fluminense.
Sobre a demora dos processos, diz considerar natural pela complexidade do caso, mas entende que isso não vai prejudicar as condenações mais adiante. Questionado a respeito da soltura dos réus da operação, ele diz que algumas medidas causam surpresa. “A gente entendia e continua a entender que as prisões eram devidas. São crimes altamente sofisticados e praticados com ferramentas tecnológicas, utilização de contas em paraísos fiscais, o que dificulta muito a investigação.”