No ar!!! Senadora, “dama do tabaco”, esconde que viajou para conhecer fábrica de ‘vapes’ na faixa

A senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS) continua demonstrando qual seu objetivo dentro do parlamento. Esse ano um questão ficou clara. Apoio incondicional a indústria do tabaco no Brasil que lhe rendeu o apelido de “musa do fumo”.

A ex-aliada do ex-presidente Bolsonaro, que já foi chamada de traíra por abandonar o líder e tentar caminhar com as próprias pernas, não divulgou com tanta ênfase a sua viagem a Bolonha foi toda custeada pela Philip Morris, empresa que tem interesse na aprovação do projeto de lei.

 Thronicke visitou a fábrica no dia 29 de maio deste ano, acompanhada por dois senadores do PSD, Sérgio Petecão e Irajá. No gigantesco complexo da empresa, o grupo conheceu todas as etapas da produção do cigarro eletrônico, da trituração das folhas de tabaco – importadas do Sul do Brasil – ao empacotamento nas caixinhas da Philip Morris. Thronicke diz ter ficado impressionada com o que viu. “Não se investe mais em cigarro comum. Só países de Terceiro Mundo, subdesenvolvidos, incluindo o Brasil”, comentou mais tarde.

Ela que sempre defendeu os vapes  retrata o caráter visionário e inovador dos cigarros eletrônicos: eles são o futuro. O futuro do emprego, o futuro dos investimentos e, acredita ela, até o futuro de uma população de fumantes mais saudável. A senadora concorda com a maior bandeira da propaganda dos fabricantes: que os cigarros eletrônicos – também chamados de vaporizadores, ou apenas vapes – são uma alternativa menos prejudicial ao organismo do que os cigarros tradicionais. Por isso apresentou no ano passado um projeto de lei que regulamenta os vapes, atualmente proibidos no Brasil.

A senadora, porém, não costuma divulgar um outro aspecto da história: A viagem é tratada com enorme discrição. A revista Piauí-UOL perguntou à Philip Morris sobre o patrocínio da visita, mas a empresa, em nota, limitou-se a dizer que “a viagem foi organizada pela Câmara de Comércio Italiana de São Paulo (Italcam)”. O vice-diretor geral da Italcam, Alfredo Pretto, disse que não comentaria o patrocínio, por se tratar de “informações organizativas internas”, e que o responsável pela visita foi o ex-senador paraibano Cássio Cunha Lima. Procurado, Cunha Linha, dono de uma consultoria que faz lobby para a Philip Morris em Brasília, não quis falar sobre o assunto devido a “restrições contratuais”. Recomendou à piauí que procurasse a Philip Morris – fechando, assim, o círculo do silêncio.

O cigarro eletrônico está proibido no Brasil desde 2009, depois que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) o considerou um produto altamente nocivo à saúde pública e que causa dependência. Desde então, numerosos estudos científicos e fatos médicos vieram corroborar essa avaliação. A indústria tabagista, porém, continua a propalar as vantagens dos vapes e não tem medido esforços para convencer políticos brasileiros.

Num primeiro momento, as empresas de cigarro apostaram as fichas numa possível mudança de entendimento da Anvisa. As discussões técnicas tramitaram na agência durante anos. Em 2023, quando ficou claro que a proibição seria mantida (o que de fato aconteceu, este ano), a indústria do tabaco começou a se mexer para o que chamava internamente de “solução legislativa”. Ou seja: virou seus canhões para o Congresso. Foi quando as fabricantes bateram na porta de Soraya Thronicke.

Thronicke conta que decidiu propor a lei por causa da derrota na Anvisa. “Nós conversamos antes de eu entrar com esse projeto”, diz ela. “Como eles só se furtavam, só proibiam, nós tomamos uma atitude.” A senadora repete, um por um, os argumentos da indústria do tabaco. Diz que o setor está entregue ao contrabando, que é impossível saber a procedência das substâncias e que só a legalização pode garantir a “qualidade” do vape. Indagada sobre por que Thronicke omitiu o patrocínio da Philip Morris à viagem a Bolonha, sua assessoria disse que, na sua visão, basta informar que a visita ocorreu a convite da câmara de comércio.

O lobby, porém, não se restringe ao Congresso. A indústria tabagista vem emplacando seus argumentos na imprensa e até no Ministério da Fazenda, que pode se beneficiar com a arrecadação de impostos caso o vape seja legalizado. Com infos de Camille Lichotti, de Brasília publicada na edição de hoje da Revista Piauí.