Investigação da Polícia Civil de Mato Grosso do Sul descobriu um esquema milionário que atravessa do Estado para a Bolívia pelo menos 200 veículos roubados ou furtados em várias partes do Brasil todos os anos.
De acordo com a Polícia, em média, 11 veículos são roubados ou furtados diariamente somente em Mato Grosso do Sul, um prejuízo enorme para os proprietários e para as seguradoras.
Na Bolívia, ainda conforme a Polícia, existe um mercado ilegal de venda de carros brasileiros e, para atender a essa demanda, quadrilhas especializadas nesse tipo de crime fazem esse mercado ilegal funcionar diariamente.
Na tentativa de combater efetivamente essas atuações ilegais transfronteiriças, a Polícia Civil e uma unidade especializada da Bolívia estão implantando um trabalho conjunto.
Os ajustes para haver uma investigação interligada tiveram início neste mês, quando dois delegados e um investigador visitaram a sede da Direção Nacional de Prevenção e Investigação de Roubo de Veículos (Diprove), em Santa Cruz de la Sierra, na Bolívia.
As conexões dos envolvidos no crime de roubo ou furto de veículo e a medida de atravessá-los para a Bolívia exigem que o crime organizado distribua as funções entre os integrantes, com possibilidade de ramificações entre os países, bem como entre os Estados.
Além dos veículos roubados e furtados em Mato Grosso do Sul, o mercado ilegal é alimentado por carros, principalmente de luxo, vindos de São Paulo, Rio Janeiro, Paraná e Santa Catarina.
Esse emaranhado de atividades ilícitas torna o trabalho da Polícia Civil difícil de ser conduzido, com as burocracias interestaduais. As apurações ficam ainda mais complexas quando envolvem necessidade de investigação de alcance internacional.
Depois que um carro entra em território boliviano, por exemplo, a Polícia Civil brasileira não consegue, legalmente, atuar. Mesmo que haja a identificação da localização do veículo furtado ou roubado.
Os policiais civis de Mato Grosso do Sul envolvidos diretamente no trabalho de estreitamento das relações binacionais com equipes da Diprove são os delegados de Ladário, Guilherme Oliveira Pena, da 1ª DP de Corumbá, e Elton Alves de Sá Júnior, além do investigador de polícia da Delegacia de Ladário, Marcos Sérgio Tiaen.
Pela Diprove, quem fez a interlocução foi o coronel Walter Sossa Rivera. A troca de informações para montar um trabalho conjunto contra o crime organizado ocorreu entre os dias 19 e 21 deste mês, na sede da Diprove.
Essa interligação entre instituições policiais tem a intenção de combater diferentes crimes transnacionais. A visita teve como objetivo o intercâmbio de experiências e técnicas investigativas e a cooperação entre os departamentos de polícia no combate à criminalidade na faixa de fronteira.
Os policiais civis receberam uma placa em reconhecimento, o que representa um importante passo para a criação de planos de cooperação mútua entre os dois países no combate aos crimes ocorridos principalmente na zona fronteiriça.
Porém, de forma especializada, o combate ao furto e ao roubo de veículos está entre as atividades principais da cooperação. Além disso, há apurações em ambos os lados sobre o uso de alguns desses veículos furtados ou roubados no transporte de cocaína da Bolívia para o Brasil.
Os temas furto e roubo de veículos ocorridos no Brasil com destinação à Bolívia, organizações criminosas e utilização de georreferenciamento para mapear possíveis rotas de tráfico de drogas e transporte de veículos e de produtos de ilícitos também foram amplamente debatidos.
As autoridades bolivianas passaram a intensificar os trabalhos na fronteira com o Brasil a partir de Puerto Suárez, cidade boliviana que fica a 20 quilômetros de Corumbá (MS) e onde foi criada no ano passado a Divisão Técnica de Identificação Veicular.
Até 2022, não tinha unidade na região, que é uma das principais na rota de entrada ilegal de veículos brasileiros furtados e roubados no país vizinho. Essa divisão é a que realiza vistorias e perícias para identificar a origem dos carros e obter a documentação legal.
Com base em alinhamento do Ministério de Governo da Bolívia e instruções do Comando Geral, a Divisão Técnica de Identificação Veicular em Puerto Suárez permite um controle efetivo de veículos sem documentação, roubados e remarcados. Uma forma de lutar contra esse tipo de crime transfronteiriço.
Mesmo com as medidas legais tomadas em 2022, as quadrilhas seguiram agindo entre os dois países. O problema atinge proprietários particulares e também empresas.
A Associação Brasileira das Locadoras de Automóveis (Abla), por exemplo, estima que 1% da frota é alvo de criminosos. São, pelo menos, 10 mil tentativas de apropriação indébita por ano no País.
A frota no fim de 2020 era de um milhão de automóveis e veículos comerciais leves, como o valor médio dos veículos está em R$ 70 mil, o valor de patrimônio das locadoras sujeito a esse risco é estimado em, pelo menos, R$ 700 milhões, indicam os dados da associação.
Em setembro de 2022, uma operação das polícias civis de São Paulo, Corumbá e Ladário conseguiu prender quatro pessoas envolvidas em uma quadrilha que atuava com o aluguel de carros em São Paulo e o transporte dos mesmos para a comercialização ilegal na Bolívia.
Havia pagamentos entre R$ 2 mil e R$ 4 mil para quem conseguisse atravessar um veículo. No país vizinho, os valores de venda de veículos, que custam mais de R$ 100 mil no Brasil, conforme apurado, variam entre R$ 30 mil e R$ 60 mil na época. Só essa quadrilha atravessou mais de 200 veículos em cerca de um ano de atuação.
Neste ano, já houve operação da Polícia Civil contra organização criminosa que atua nesse mesmo tipo de crime. O Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) também agiu na região de fronteira e, no fim de abril, interceptou três suspeitos de atuarem no crime de atravessar veículos para a Bolívia.
No caso envolvendo o Bope, Christian Bastos de Oliveira, de 27 anos, Gian Carlos Amarillo do Nascimento, de 29 anos, e João Paulo do Nascimento Ferreira, de 25 anos, morreram em confronto com a polícia. Um policial foi atingido no colete e não sofreu ferimentos. Os três investigados moravam em Corumbá. Com informações do Correio do Estado