Dados do Anuário Brasileiro da Educação Básica 2019, divulgados ontem, revelam que quatro em cada dez professores que davam aula para os anos finais do Ensino Fundamental (entre o 6º e o 9º ano) no Brasil em 2018 não tinham formação adequada para o que ensinavam. Isso corresponde, por exemplo, à situação de um professor formado em matemática, mas que acaba dando aulas de física.
Segundo o levantamento, 37,8% dos docentes dos anos finais do Ensino Fundamental não tinham licenciatura ou complementação pedagógica na área da disciplina pela qual eram responsáveis. No Ensino Médio, esse índice ficou em 29,2% dos educadores. O indicador não foi considerado para os anos iniciais do ensino fundamental porque, nessa etapa, ainda não há uma divisão clara entre as disciplinas ensinadas para os alunos.
O anuário é resultado de uma parceria entre o movimento Todos pela Educação e a editora Moderna e tem como base os microdados do Censo e os dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) Contínua, realizados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Para a Coordenação de Projetos no Todos pela Educação, a falta de formação específica dos professores é reflexo de vários fatores. Na média, o Brasil vem atraindo [para a docência] quem tem as médias mais baixas no Enem [Exame Nacional do Ensino Médio].
O baixo salário, o conteúdo excessivamente teórico na formação inicial e a dificuldade em progredir na carreira dentro das redes de ensino são fatores que desestimulam os professores, que eventualmente acabam encontrando “outro caminho possível, que seja o de não dar aula”.
Dados do mesmo anuário mostram que, em 2018, o rendimento médio dos professores da educação básica correspondia a 69,8% do salário médio dos profissionais com curso superior. Comparando apenas com profissionais das áreas de exatas ou saúde, os professores recebem 50%.
A garantia da formação docente na educação básica é uma das 20 metas previstas pelo PNE (Plano Nacional da Educação), que completa cinco anos de vigência nesta terça (25). Criado por lei em 2014, o PNE previa que, no ano seguinte, fosse assegurado a todos os docentes da educação básica uma formação específica de nível superior na área de conhecimento em que atuassem.
O MEC (Ministério da Educação) do ministro Abraham Weintraub tem em mãos, hoje, uma proposta de base nacional docente apresentada em dezembro de 2018 pelo então ministro Rossieli Soares.
O documento sugere uma avaliação anual para habilitação dos professores e a criação de um programa de residência pedagógica. A gestão de Weintraub ainda não informou se já analisou a proposta e se pretende realizar alterações nela.”
A partir do momento em que esses professores forem capacitados nas universidades em linha com essa base, a gente vai conseguir ter um grande salto. É uma das coisas que o governo federal precisa fazer, acelerar essa base”, defende Thaiane Pereira.
A falta de preparo específico dos professores, afirma, traz consequências para o aprendizado dos alunos. “Se ele [aluno] não aprende fração, muito dificilmente vai conseguir resolver uma equação lá na frente. Os professores têm papel crucial nisso, porque são os agentes que estão com os alunos.”
Outros dados do relatório
Oferta de creches e desigualdade: enquanto somente 26% do quartil mais pobre da população frequenta creches, no quartil mais rico esse percentual é de 55%;
Alfabetização: apenas 14,1% das crianças do grupo de nível socioeconômico muito baixo possuem nível suficiente de alfabetização em leitura. Esse patamar é alcançado por 83,5% das crianças do grupo de nível socioeconômico muito alto;
Evasão escolar: o Brasil ainda tem 1,5 milhão de crianças e jovens (de 4 a 17 anos) fora da escola;
Ensino fundamental: apesar de o país atender 99,3% dos jovens de 6 a 14 nessa etapa de ensino, a conclusão na idade esperada está distante da ideal. Quase um quarto dos alunos termina o ensino fundamental com mais de 16 anos.