Não demorou muito para que a “jeitinho” do ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marun, lhe trouxesse problemas. Porém, agora, a causa da dor de cabeça dele é a esposa, Luciane Marun, que, decorrência de uma ação para lá de suspeita, colocou o marido na mira da Comissão de Ética da Presidência da República (CEP), conforme informou o presidente Luiz Navarro.
Ele vai levar para discussão na próxima reunião do grupo as agendas públicas do ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marun, com autoridades de países árabes e a relação disso com a Bropp, uma consultoria empresarial focada no mundo árabe, empresa da mulher do ministro. A reunião está marcada para o dia 25 de abril. O caso foi revelado na última edição da revista Época.
Desde o início de 2016, Marun teve vários encontros com autoridades e empresários de países do Oriente Médio. Naquela época, Luciane Marun transformou uma empresa que fazia “atividades de cobrança e informações cadastrais”, a Luana Assessoria de Crédito Empresarial Ltda., na Bropp – focada em assessoria empresarial para empresas do mundo árabe.
No Ministério, Marun já fez ao menos sete encontros oficiais com autoridades do Kuwait, da Líbia, da Tunísia, do Iraque e do Líbano. O GLOBO solicitou os registros dos encontros do ministro com esses embaixadores por meio de Lei de Acesso à Informação, mas em nenhuma dessas reuniões foi produzida uma ata. Na última semana, ele esteve com o presidente Michel Temer no Fórum Econômico Brasil-Países Árabes, em São Paulo. Seu antecessor no cargo, o deputado Antonio Imbassahy (PSDB-BA), não registrou agendas com essas autoridades ao longo de quase um ano.
Quando ainda era apenas deputado federal, Marun, viajou em missão oficial da Câmara dos Deputados para os Emirados Árabes e Qatar, acompanhado do diretor financeiro da Bropp. A viagem ocorreu entre os dias 18 a 23 de dezembro de 2016 e ele ele recebeu R$ 1.577,40 para cinco diárias no período. O ministro confirmou que esteve em Dubai no banco SG Morgan com Mário Fernando Calheiros, diretor comercial da Bropp.
“Ele (Calheiros) que fez esse contato desse banco comigo”, admitiu. Marun sustenta, no entanto, que não há conflito de interesses entre sua atuação pública e a Bropp. “Torço para que ela tenha sucesso. Ela é uma mulher que trabalha, não é uma dondoca, e, dando certo os negócios que ela está conduzindo, isso vai ser bom para o Brasil também”, disse Marun.
No relatório de prestação de contas da viagem ao Qatar, o então deputado escreveu que as visitas serviram para “discutir temas de cooperação econômica” e informou que esteve no banco de investimentos SG Morgan. A revista Época publicou fotos desse encontro, no qual estavam Marun, Calheiros e Shaun Gregory Morgan, CEO do banco.
Morgan nasceu na Nova Zelândia, mas já foi condenado e preso em dois países por fraudes. Primeiro na Suíça, após uma fraude de US$ 30 milhões, e em Utah, nos EUA, quando se declarou culpado por dirigir um banco falso e passar cheques falsos para comprar 40 propriedades.
Os casos foram revelados pelo jornalista Matt Nippert, do NZ Herald, jornal de maior circulação de Auckland, na Nova Zelândia. Em 2013, depois de cumprir pena, ele foi deportado para a Nova Zelândia e se envolveu em novos casos de fraude na Austrália. Em seu site, o SG Morgan afirma, genericamente, que faz diversos investimentos, mas não apresenta clientes ou empreendimentos que trabalharam com o banco.
Defesa
Segundo Marun, as conversas entre o banco e a Bropp não evoluíram. Com versão de seu site em português, inglês e até em árabe, a empresa diz que o Brasil vive um “momento especial” da vida política e econômica.
“A chegada definitiva do presidente Michel Temer ao poder traz a estabilidade necessária para que este imenso país se transforme no desaguador de investimentos internacionais.” A atividade da Bropp é bastante ampla.
Assessora investidores interessados desde em mineração até em turismo, incluindo energia renovável, agronegócios, mineração, siderurgia, infraestrutura e projetos residenciais de alto padrão.Luciane diz que não faz “nada com empresa pública”. Dentro do quadro de sócios está Aldemir Almeida, um dos antigos assessores de Marun no gabinete da Câmara.
Em 1º de agosto daquele ano, Marun registrou em seu Facebook um encontro com o então embaixador dos Emirados Árabes, Khalid Khalifa, no qual estava acompanhado de Luiz Alberto Sperotto, à época diretor comercial da Bropp. Na legenda da foto, Sperotto foi apresentado apenas como “economista”. Antes disso, Marun tinha feito duas viagens em missão oficial da Câmara para países árabes. Em junho de 2015, foi para o Líbano com um grupo de deputados. No ano seguinte, repetiu presença no Líbano.
Segundo a professora de Direito da FGV Silvana Battini, especialista em improbidade administrativa, esclareceu o que a legislação prevê, em tese, nesses casos. “Se essa pessoa gastou dinheiro público a que ela tinha acesso em função do cargo em benefício próprio ou de terceiro, isso poderia caracterizar sim um crime, de peculato. Além disso, improbidade administrativa. Em tese”, disse. O ministro é réu na Justiça estadual de Mato Grosso do Sul por improbidade devido a contratos com uma empresa de tecnologia da época em que era titular da Pasta da Habitação.