Agetran ‘afronta’ juiz e notifica mais 7 mil condutores em Campo Grande
Novos editais de autuações e penalidades trazem aproximadamente 7,8 mil condutores notificados, contrariando liminar que pedia suspensão da aplicação e de cobranças de eventuais multas aplicadas
Agetran justifica que autuações – referentes ao período entre 21 e 31 de agosto – foram aplicadas antes da concessão da liminar – Gerson Oliveira/Correio do Estado
A Agetran (Agência Municipal de Transporte e Trânsito) estaria desrespeitando a decisão liminar do Juiz de Direito, Flávio Renato Almeida Reyes – que mandou o município de Campo Grande “cessar a aplicação de penalidades decorrentes desses aparelhos de fiscalização, e de cobrar multas eventualmente aplicadas” -, A Agetran publicou hoje (12) mais uma leva de autuações e penalidades aos condutores, de um período anterior ao novo contrato para gestão dos radares.
A ação popular que buscava esclarecer sobre o caso do fim do contrato para gestão dos radares e a legalidade das multas aplicadas
No dia 05 de setembro por meio de decisão liminar assinada pelo Juiz de Direito, Flávio Renato Almeida Reyes determinou que os procedimentos da Agetran cessassem.
Para evitar que multas sejam pagas, que penalidades sejam aplicadas e inclusive que pagamentos indevidos sejam feitos ao Consórcio Cidade Morena, ex-gestor dos radares em Campo Grande, o juiz determinou o fim do pagamento da dita “confissão de dívidas” e pede para cessar a aplicação de penalidades decorrentes desses aparelhos de fiscalização, e de cobrar multas eventualmente aplicadas.
Porém, em resposta ao Correio do Estado, a Pasta deixa claro que realizaram a publicação do edital para não perder o prazo de aplicação das multas, em “afronta” à decisão do juiz, uma vez que demonstra a crença de que devem conseguir receber a arrecadação pelas autuações.
Segundo a Agetran, as autuações foram aplicadas antes da concessão da liminar – pois essas em questão são referentes ao período entre 21 e 31 de agosto -, ressaltando que há uma série de prazos legais entre as emissões e notificações. Segue abaixo na íntegra a nota de retorno da Agetran.
“A Agência Municipal de Transporte e Trânsito (Agetran) informa que as autuações foram aplicadas antes da concessão da liminar, considerando que a publicação das autuações ocorre em intervalos de 10 dias. Ressaltamos ainda que há prazos legais tanto para a emissão das notificações quanto para sua publicação.
A Agetran reforça seu compromisso contínuo com a melhoria da mobilidade urbana e da segurança viária”.
Entenda
Esse assunto em questão trata-se do antigo contrato, entre a Prefeitura de Campo Grande e o Consórcio Cidade Morena, que durava desde 2018 e atingiu o limite máximo de aditivos permitidos, sete no total, que somaram R$54.820.284,75, com consequente fim em 05 de setembro de 2024, a partir de quando a pasta começou a ser questionada a respeito da continuidade do serviço e legalidade.
Como bem acompanhou o Correio do Estado, a Agetran chegou a justificar que os reconhecimentos de dívidas estabelecidos com o Consórcio Cidade Morena seriam uma “medida legítima para evitar enriquecimento ilícito da Administração”, diante da “necessidade de fiscalização para preservar a segurança viária”.
Conforme exposto em trecho da liminar, ainda que situação momentânea e excepcional, a contratação do Consórcio deveria ser precedido de um aditamento, de uma dispensa de licitação ou de qualquer outro instrumento idôneo, que não o reconhecimento de dívidas
“Que não poderia jamais anteceder os fatos: o reconhecimento de dívida é ato que recai sobre o passado, e não sobre o futuro”, cita o texto assinado pelo Juiz de Direito, Flávio Renato Almeida Reyes.
Tendo em vista a falta de qualquer relação contratual desde setembro de 2024, a decisão aponta que o problema é que o contrato embasava justamente a fiscalização por parte do Consórcio Cidade Morena.
“Mais grave ainda é que estamos a tratar do poder de polícia do Estado, ou seja, o poder que o Estado (com letra maiúscula) exerce para regular e limitar direitos.
E quando se está a tratar da temática de Poder de Polícia, sabe-se bem que vários desdobramentos podem surgir, principalmente com relação à validade dos atos praticados.
Com isso não quero afirmar que o Consórcio exerce o dito poder de polícia, mas sim que ele é instrumento operacional para tanto”, expõe o recorte do texto.
Troca da empresa de radares
Após a empresa Serget Mobilidade Viária sair vencedora da concorrência com uma oferta de R$ 47,9 milhões, quase R$ 3 milhões a menos que os R$ 50,2 milhões estipulados pelo certame, em um contrato de 24 meses que pode se estender por um prazo total de até 10 anos no comando dos radares de Campo Grande, a responsável precisará agora trocar todos os radares.
Importante lembrar que, o último dia de agosto foi justamente a data que marcou o desligamento dos populares “radares” em Campo Grande, que já amanheceu o dia 1° de setembro sem os aparelhos funcionando.
Para além de se encarregar da troca de todos os radares, a Serget Mobilidade Viária deverá fornecer a devida plataforma de gestão de dados, mais: central de monitoramento; sistema de análise e inteligência de imagens veiculares e de processamento de registros de infrações de trânsito nas vias e logradouros públicos.
Multas sem contrato
Que as multas em Campo Grande seguem sendo cadastradas mesmo após o fim dos radares não é novidade, uma vez que após o contrato original vencer, entre os dias 23 de setembro e 03 de outubro de 2024 pelo menos 94 páginas de autuações de veículos foram publicadas através do Diário Oficial de Campo Grande.
Para se ter uma ideia do volume, somente em aproximadamente um terço desse total, há aproximadamente 7,3 mil infrações registradas em apenas 34 dessas páginas de multas aplicadas.
Nesta publicação do suplemento I do Diogrande de hoje (12), por exemplo, há um total de 36 novas páginas, sendo um edital de notificação de autuações e dois de penalidades, somando aproximadamente 7,8 mil condutores notificados por penalidades no trânsito em Campo Grande.
Também cabe relembrar que, mesmo após abertura da ação para anulação, as multas seguiram sendo cadastradas em Campo Grande neste 2025, uma vez que dados de arrecadação da Agetran mostram que, sem radares e lombadas – e suas respectivas multas – a pasta da Capital deixa de contar com cerca de R$ 3 milhões ao mês.
Ex-prefeito de Campo Grande, Marquinhos Trad é autor da ação enquanto vereador – na tentativa de anular mais de 320 mil autuações, como acompanha o Correio do Estado – e, sobre a nova leva de notificações, ele expõe achar um absurdo tendo em vista que não existe um contrato vigente.
“Vendo que não há contrato vigente é a demonstração de como a Prefeitura de Campo Grande ‘cuida’ da sua gente”, afirma.
Com ampla veiculação do assunto pela imprensa local, é notório que tanto o diretor-presidente quanto a Prefeitura municipal confessaram ter ciência da decisão liminar, portanto a publicação de tais editais só poderiam acontecer com autorização expressa.
“O diretor (Paulo da Silva) não publicaria se não tivesse aval da prefeita e da PGM [Procuradoria Geral do Município], do departamento jurídico. Ele só fez a publicação, porque vai alegar que não foram avisados ou intimados oficialmente . Conclusão, continuam cometendo atos de improbidade administrativa”, conclui ele. Com infos Correio do Estado