Demorou, mas acabou acontecendo. O advogado e funcionário de carreira da Câmara de Vereadores de Campo Grande, André Scaff, recém libertado da prisão pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS), perdeu o cargo de procurador jurídico da Casa de Leis.
O presidente da Câmara de Vereadores, João Rocha (PSDB), nomeou, no dia 6 de janeiro, o novo procurador jurídico da Casa de Leis. Trata-se do advogado criminalista Luiz Gustavo Lazzari, que já foi professor colaborador vinculado à Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) e assessor jurídico de desembargador do TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul).
Apesar de Andre Scaff saber muitas coisas que, para o bem de muitos, devem continuar em segredo total, o presidente da Câmara de Vereadores resolveu arriscar a própria cabeça e atendeu ao anseio da população, tirando do cargo uma pessoa que está enrolada até o pescoço com a Justiça.
Sentado sempre a esquerda do presidente da Câmara, Scaff tinha ascensão a vários parlamentares. Vale lembrar que na Comissão Processante que recomendou o afastamento do prefeito Alcides Bernal do cargo em março de 2014, o ex-procurador jurídico atuou de forma incisiva e estava sempre figurando na mesa de trabalhos da comissão.
Depois da saída de Bernal e de seu vice, Gilmar Olarte, assumir a Prefeitura, Scaff foi parar onde mesmo? Na Secretária Municipal de Finanças do município. Isso mesmo, com a chave do cofre na mão.
Não é à toa que o Ministério Público acusa André Scaff de ter recebido perto de meio milhão de reais das mãos do empreiteiro João Amorim, aquele da Lama Asfáltica. O dinheiro saiu da construtora Proteco direto para a conta do “Tio Patinhas”. Como explicar isso?
André Skaff viu o sol nascer quadrado por três vezes somente no ano passado. A última visita do servidor à prisão foi por decisão do juiz Carlos Alberto Garcete, que acatou pedido de que Scaff estaria prejudicando as investigações do Gaeco contra ele, atrapalhando a coleta de provas.
Durante as investigações da segunda fase da Operação Midas, o Gaeco colheu elementos de que o procurador, depois de ter sua prisão preventiva revogada em 20 de setembro, passou a agir com intenções de prejudicar as investigações. Ele foi preso com a esposa, Karine Ribeiro Mauro Scaff, no dia 18 de setembro, e só foram soltos no dia 21 do mesmo mês.
Talvez Scaff seja o único servidor do legislativo municipal que saiba da vida de todos os vereadores da atual legislatura e de outras, uma vez que já está por lá há mais de 30 anos.
Entenda o caso
Com fundamento nos art. 312 e art. 316 do Código de Processo Penal, o juiz Carlos Alberto Garcete de Almeida, da 1ª Vara do Tribunal do Júri de Campo Grande, decretou a prisão preventiva de Andre Scaff, acusado de vários crimes. O pedido foi feito pelo Ministério Público Estadual, por meio do Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco).
A prisão preventiva é pleiteada pelo Ministério Público sob o fundamento da conveniência da instrução criminal e o processo será mantido em segredo de justiça por conter material relacionado à interceptação telefônica, cujo acesso público é vedado por lei.
De acordo com o Gaeco, após diversas diligências, teria se constatado que na condição de servidor público, inúmeras vezes, André Scaff recebeu milhões de reais provenientes de pagamentos ilícitos, possivelmente de empresas que possuíam contratos junto à administração pública.
Relatório do Gaeco mostra que foram identificadas inúmeras remessas, sem justificativas, de recursos para as contas bancárias do investigado, cujo total alcançou montante superior a R$ 3.500.000.00, além de mais R$ 3.045.325,31 em depósitos não identificados.
Para o Gaeco, as provas revelam que os valores detectados nas contas de Scaff são de propina, já que ele e a esposa ocultavam e dissimulavam a origem da verba, a movimentação e o destino de tais quantias, resultando em fortes indícios do cometimento, por várias vezes, dos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
Ao analisar minuciosamente os fatos noticiados pelo Gaeco, Garcete entendeu que está demonstrada a possível existência dos supostos delitos de organização criminosa (Lei nº 12.850/2013), lavagem de dinheiro (Lei nº 9.613/1998), crimes contra a administração pública, crimes contra a ordem tributária, dentre outros.
“Há indicativos robustos de diversas transações imobiliárias realizadas por André Scaff, com enorme incompatibilidade entre o preço de mercado e o declarado às autoridades fiscais para efeito de lançamento, pelo que, por conseguinte, escrituras públicas podem conter conteúdo ideológico falso, tudo a indicar os delitos acima mencionados, cujo escopo, em última razão, seria dissimular o real valor de seu patrimônio, tornando-o compatível com seus rendimentos”, escreveu o juiz.
Conforme descrito no decreto de prisão preventiva, as provas colhidas até o momento indicam que Skaff era peça fundamental em um esquema criminoso na administração pública municipal, já que centralizava parte das propinas referentes a contratos de empresas com a Câmara de Vereadores e o Executivo Municipal, além de existirem suspeitas de que agia como operador de um partido político durante as campanhas eleitorais. Para isso, tinha ajuda da esposa, que fornecia nome e conta bancária para lavagem do dinheiro oriundo de propina.
“É induvidoso que André Scaff não está medindo esforços para influir nos itinerários probatórios das investigações, já que deliberadamente está agindo para apagar provas e consequente obstar a busca da verdade real, o que é motivo concreto e idôneo para decretação da prisão preventiva”, acrescentou Garcete.
Além disso, o André Scaff foi denunciado por associação criminosa no processo referente à Operação Coffee Break. Ao todo foram denunciados 24 empresários e políticos, entre eles, os vereadores que supostamente teriam recebido vantagens financeiras ou cargos na Prefeitura para votarem pela cassação do prefeito Alcides Bernal em 2014.
A denúncia está distribuída em três grupos. No grupo “associação criminosa” estão aqueles que teriam organizado e planejando as ações para que o esquema para a cassação do prefeito desse certo. Já os que foram denunciados por “corrupção ativa” seriam os responsáveis pelo trabalho a campo, de conversar com os vereadores para convencê-los a votar pelo afastamento de Alcides Bernal.
Para isso, teriam oferecido aos políticos vantagens financeiras e cargos na administração do vice-prefeito Gilmar Olarte, caso ele assumisse a Prefeitura. Já os vereadores foram denunciados por “corrupção passiva”, por terem aceito vantagens para votar pela cassação.