Há exatos seis meses e 14 dias, a cidade paraguaia de Pedro Juan Caballero, na fronteira seca com o Brasil, vizinha à brasileira Ponta Porã (MS), assistia a um crime cinematográfico, digno de um “blockbuster” de Hollywood – palavra de origem inglesa que indica um filme feito para multidões -, e que continua sem resposta por parte das autoridades paraguaias e brasileiras sobre quem realmente encomendou o assassinato de um dos maiores chefões da fronteira.
Estamos falando da execução do narcotraficante Jorge Rafaat Toumani, que foi alvejado, de forma espetacular, por uma metralhadora de alto impacto, de calibre .50, usada para derrubar helicópteros e até parar carros de combate, que furou o veículo blindado modelo Hummer, utilizado pelo ex-chefão da fronteira, e o aniquilou imediatamente.
Morria o homem mais poderoso daquela região do Paraguai, que fez fama e fortuna por meio do tráfico de armas e drogas, bem como via contrabando de eletrônicos e perfumarias. Ele era conhecido na cidade paraguaia como um grande empresário, dono de várias lojas de revenda de pneus. Tinha uma mansão protegida por seguranças e fazia todo dia o mesmo percurso entre a casa e o trabalho.
Por que então a Justiça Federal do Brasil não pediu a extradição dele já que Rafaat estava condenado a quase 50 anos de prisão por crimes em território brasileiro? Pelo menos por enquanto essa pergunta está sem resposta. A Justiça se calou em Mato Grosso do Sul e não responde a essa questão. As perguntas sobre esse caso são inúmeras.
Cadê os 100 homens que a polícia paraguaia disse que agiram no crime? Qual o desenrolar das investigações? O que as autoridades brasileiras e sul-mato-grossenses fizeram para melhorar a segurança e proteger a população na fronteira? Quem foi o mandante e custeou o crime? Como essa arma potente chegou a Pedro Juan Caballero? A verdade é uma só. Quando o Estado é fraco a bandidagem toma conta.
Primeira hipótese
Ao descobrir uma estrutura gigante criada pela organização criminosa brasileira Primeiro Comando da Capital (PCC) para lavar somas consideráveis de dinheiro sujo do narcotráfico na região de fronteira, foi apontada como hipótese pela morte de Rafaat que o crime teria sido encomendando pelo brasileiro e foragido Elton Leonel Rumich da Silva, conhecido pelo apelido de “Galã”, que aparece como o chefe da estrutura, que incluía fazendas de criação de bovinos, estações de serviço e vários edifícios em diferentes partes do Paraguai.
Segundo os investigadores, essa estrutura gigantesca foi instalada na cidade de Pedro Juan Caballero, na fronteira seca com o Brasil, após o ataque que matou o mafioso Jorge Rafaat Toumani na noite de 15 de junho passado na cidade a tiros de uma metralhadora de calibre .50. Na verdade, Galã foi acusado de ser o mentor intelectual e executor do assassinato de Rafaat, uma vez que esse controlava toda a área de fronteira e não permitia que outros criminosos, tanto do PCC, quanto do Comando Vermelho, ser instalassem na região.
Outra possível versão
A Polícia do Paraguai também garante que a morte de Rafaat teria relação com o fato de mafiosos italianos, cartéis mexicanos e colombianos, líderes brasileiros, produtores peruanos e bolivianos terem estabelecido uma espécie de cooperativa do crime organizado para continuar com os seus negócios de tráfico de drogas em escala global a partir do Paraguai.
Essa “cooperativa da droga” começou a ser descoberta com a prisão de membros do Cartel de Sinaloa – um grupo de traficantes mexicanos poderosos liderados por Joaquín “El Chapo” Guzman, talvez o traficante de drogas mais famoso do mundo desde o colombiano Pablo Escobar. Eles foram presos a poucos minutos da Assunção, capital do Paraguai, o que revelou que o país tem um papel chave no tráfico de drogas a partir da região para o mundo.
Os criminosos caíram com uma carga de mais de 300 quilos de cocaína que estava sendo preparada para ser enviado para a Holanda, na Europa, usando uma empresa de fachada destinada a levar a droga como uma exportação legal para o solo europeu. No Paraguai vivem os membros do cartel mexicano de Sinaloa, dos grupos criminosos brasileiros PCC (Primeiro Comando da Capital) e Comando Vermelho e até representantes da “Ndrangheta”, a famosa máfia calabresa (Itália).
Em suma, a droga processada por cartéis colombianos e mexicanos na Colômbia, Peru e Bolívia chegam ao Paraguai, onde os brasileiros do PCC são responsáveis por levá-las aos italianos, que são responsáveis pela distribuição pela Europa e África. Curiosamente, a cada vez mais forte presença dos italianos e mexicanos coincidiu com o assassinato de Jorge Rafaat Toumani, um homem que tinha sido condenado a 40 anos de prisão no Brasil e nomeado pela Justiça brasileira como sendo o cabeça do tráfego drogas e armas por meio da fronteira seca entre os dois países.
De acordo com várias fontes, uma aliança da qual faziam parte os grupos criminosos brasileiros PCC e Comando Vermelho teria sido a responsável por ordenar o assassinato de Jorge Rafaat Toumani, ocorrido em julho, mas que já tinha sido tentado em março, quando a Polícia encontrou um caminhão blindado com armas similares as que eles usaram para matar o mafioso. Com a morte dele, o brasileiro Jarvis Chimenes Pavão, que está cumprindo pena no Paraguai, tornou-se assim o novo mestre do submundo na fronteira.
Outra hipótese
Outra hipótese para o assassinato de Rafaat foi apresentado pelo senador paraguaio Robert Acevedo, que é presidente do Congresso Nacional. Ele informou que o narcotraficante brasileiro Jarvis Chimenes Pavão, que está preso em Assunção, teria mandado matar o também traficante Jorge Rafaat Toumani, no dia 15 de junho em Pedro Juan Caballero, na fronteira seca com Mato Grosso do Sul, porque ele estava articulando a extradição do rival para o Brasil.
Ele disse que, mesmo preso, Pavão continuou controlando o tráfico de drogas do Paraguai para o Brasil, além de ordenar a morte de seus oponentes. “Rafaat foi assassinado porque ele estava tramando a extradição de Pavão para o Brasil em parceria com uma autoridade Paraguai”, afirmou. Ainda segundo o senador, Rafaat estava ajudando as autoridades em vários casos, inclusive a Força Tarefa Conjunta (FTC), que combate o grupo EPP em San Pedro, Concepción e Amambay. “Rafaat estava tramando a extradição do rival. Pelo menos essa era sua intenção”, insistiu.
Acevedo advertiu também que várias outras pessoas estão em risco por causa da vingança de Pavão. “Muitas pessoas estão em situação de risco, todas as pessoas que o denunciaram. Ele é um homem muito perigoso”, afirmou. O senador disse que o ministro do Interior também está em perigo porque foi ele quem atuou como procurador na captura de Pavão. “O próprio De Vargas pode estar em perigo porque foi ele quem o capturou em 2009”, reforçou.
O parlamentar disse que todos aqueles que procuram levar Pavão para o Brasil correm risco de morte e que o narcotraficante está disposto a fazer qualquer coisa para continuar no Paraguai com todos os seus privilégios. “Lá (no Brasil) vão levar ele para uma prisão de segurança máxima porque é altamente perigoso. Infelizmente, no nosso país, ele vive como um rei”, lamentou.
Para o ministro Francisco de Vargas, as declarações do senador fazem sentido. “Nós não podemos duvidar da credibilidade das informações, pois elas vêm do presidente do Congresso e fazem sentido”, declarou. No entanto, a única certeza é que a morte de Rafaat ajudou muita gente ligada ao crime organizado, tanto no Paraguai, quanto no Brasil, e, por isso, os culpados pelo crime jamais serão de fato conhecidos.