Relatório aponta que avanço do plantio de soja em Bonito pode prejudicar turismo ecológico

Nota técnica, intitulada “Análise e Riscos das Mudanças no Uso e Ocupação do Solo da Bacia Hidrográfica do Rio Miranda” e assinada pelo Instituto SOS Pantanal, Instituto Tamanduá, Instituto Libio, Fundação Neotrópica do Brasil e SOS Mata Atlântica, destacou que a qualidade da água na região de Bonito está ameaçada, ocasionando um efeito cascata negativo para a biodiversidade e que vai desaguar em algum ponto no ecoturismo.

Com base nos levantamentos feitos pelo MapBiomas e outras 30 fontes de pesquisa, o relatório das cinco instituições ambientais apontou que o avanço do cultivo da soja está intrinsecamente ligado aos perigos que estão pressionando o território. A partir dos números disponíveis, houve a identificação de um aumento de mais de 1.000% na área de plantio. Saiu de 0,4%, em 1985, para 7% do território do município, em 2023. Essa substituição de vegetação nativa por monocultura gera diferentes danos.

“Mudanças no uso e cobertura do solo, especialmente apoiadas no monocultivo de soja, têm acarretado […] a degradação da qualidade da água, o aumento da erosão do solo, a perda de biodiversidade e a alteração dos regimes hidrológicos”, detalhou a nota técnica assinada pelo Instituto SOS Pantanal, Instituto Tamanduá, Instituto Libio, Fundação Neotrópica do Brasil e SOS Mata Atlântica.

“Outro problema está ligado à contaminação ambiental por metais pesados, como cádmio, chumbo, cobre e zinco, que, somados à intensificação do uso de agrotóxicos na paisagem, podem afetar diretamente não somente a saúde da fauna e da flora e a fertilidade do solo, mas também representam um risco significativo à saúde humana através da bioacumulação ao longo da cadeia alimentar”, trouxe a nota.

A Bacia Hidrográfica do Rio Miranda engloba municípios como Miranda, Bodoquena, Bonito, Jardim, Nioaque, Anastácio, Aquidauana, Dois Irmãos do Buriti, Sidrolândia, Terenos, Corguinho, Rochedo, Jaraguari e Bandeirantes. Nesse território, ecossistemas apontados como mais sensíveis e vulneráveis a sofrer danos com atividades que geram impactos ambientais ficam próximos a Bonito, com influência direta nos rios cênicos Formoso e da Prata.

Afetar a qualidade da água em Bonito pode gerar repercussão em um Produto Interno Bruto (PIB) de aproximadamente R$ 1,2 bilhão. Por lá, o setor de serviços movimenta 40% da economia, principalmente por conta do turismo. A agropecuária, porém, é também um dos motores do PIB, representando cerca de 36%, além da administração pública (15%) e da indústria (8%). São mais de 300 mil turistas que visitam a cidade de 25 mil habitantes por ano.

Na nota técnica, tanto a pastagem como a soja emergiram como setores que geram impactos negativos para a garantia das belezas da Capital do Ecoturismo. “A classe de uso do solo ‘pastagem’ apresentou uma flutuação nos 38 anos de dados disponíveis. Inicialmente, 24% do território da BHRM [Bacia Hidrográfica do Rio Miranda] era ocupado por pastagens, elevando para 45% em 2005 e reduzindo para 38% em 2023. Houve um acréscimo desta classe em mais de 600 mil hectares entre 1985 e 2023. A classe ‘soja’ chama atenção pela grande diferença. Em 1985, apenas 0,4% da área da BHRM, totalizando mais de 16 mil hectares. Em 2005, já havia saltado para 2,3% do território, ampliando em mais de 80 mil hectares. Em 2023, esta cultura atingiu 7% da área da bacia, ocupando 300 mil hectares. De 1985 para 2023, ocorreu um salto de mais de 280 mil hectares”, elencou a pesquisa.

A Bacia Hidrográfica do Rio Miranda engloba 94% do município de Bonito. Com isso, os efeitos nesse território geram repercussão direta na cidade e na sua economia. Além disso, os efeitos para mitigar os danos ambientais devem exigir esforços ainda maiores. A Bacia Hidrográfica do Rio Miranda engloba quase 12% de Mato Grosso do Sul, ou seja, uma área de 42 mil km², além de ser fundamental para alimentar o Pantanal. O Rio Miranda, principal na bacia, nasce na Serra de Maracaju e flui na direção oeste, desaguando no Rio Paraguai.

As sub-bacias do Rio Aquidauana, Rio da Prata, Rio Formoso e Rio Salobra também têm influência, e o que ocorre nessas regiões pode causar efeito cascata. A nota técnica, que foi elaborada a partir de dados divulgados em meados de maio deste ano, indica que a cobertura florestal superior a 30% é um fator determinante para assegurar a proteção à biodiversidade. Espécies como o veado-catingueiro e a anta estão entre as mais afetadas.

Além disso, há indicação para que estudos técnicos sejam mais rigorosos para conceder o licenciamento de atividades econômicas em áreas de transição entre Mata Atlântica e Cerrado, especialmente com atenção à Lei nº 11.428/2006 (Lei da Mata Atlântica). O município de Bonito também já tem legislação, dentro de sua Lei Orgânica, sobre a existência de faixas de preservação ao longo de corpos d’água, mas ela não estaria sendo respeitada à risca. Foi indicado também uma maior atuação para que seja respeitada a zona de amortecimento do Parque Nacional da Serra da Bodoquena.

A implementação de um zoneamento ecológico-econômico municipal também é apontada como medida necessária para garantir o uso do solo com mais adequação aos limites ambientais. O governo estadual informou que, neste ano, está com ações em andamento para preservar recursos hidrogeológicos em Bonito. A primeira reunião de trabalho ocorreu em fevereiro e envolveu técnicos da administração estadual, da prefeitura de Bonito e também da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Com informações do Correio do Estado