O MPE (Ministério Público Estadual) ofereceu nesta segunda-feira (23/01) denúncia à Justiça contra o policial rodoviário federal Ricardo Hyun Su Moon, 46 anos, pelo homicídio do empresário Adriano Correia do Nascimento, 33 anos, que foi assassinado em Campo Grande após uma briga de trânsito no dia 31 de dezembro do ano passado.
O advogado Renê Siufi, que trabalha na defesa do policial rodoviário federal, disse que aguarda o MPE oferecer denúncia à Justiça para iniciar os trabalhos em defesa do seu cliente. “Estou aguardando, mas por enquanto não foi oferecido nenhuma denúncia. Somente, após esse processo é que vamos iniciar os trabalhos”, disse o advogado à imprensa.
Preso na sede do Garras (Delegacia Especializada de Repressão a Roubo a Banco e Resgate) em cela isolada, Ricardo Hyun Sun Moon teve o inquérito contra ele concluído no dia 17 de janeiro deste ano pela delegada Daniela Kades. O resultado foi o indiciamento do PRF por homicídio doloso, quando há intenção de matar, e por duas tentativas de homicídio.
De acordo com a delegada responsável pela investigação do caso, o conjunto de provas, que engloba áudios das ligações feitas por Ricardo Moon ao Centro Integrado de Operações de Segurança (Ciops), oitiva de 20 pessoas, entre elas, 15 testemunhas, laudo da arma do policial e do local do crime, indicou que o “Coreia”, como é conhecido pelos colegas de PRF, teve intenção de matar Adriano Correia, bem como os outros dois ocupantes do veículo, um adolescente e o pai dele.
O inquérito tem 531 páginas e será remetido ao poder Judiciário, porém, uma série de laudos complementares, como da reprodução simulada e do corpo de delito dos dois sobreviventes, ainda será finalizada e anexada ao processo judicial. A delegada informou ainda que ficou comprovado que o empresário invadiu a pista onde estava o PRF, no entanto, não se sabe até o momento o que motivou a atitude – a hipótese de buraco na pista foi descartada pela Polícia Civil.
Em relação à alegação de legítima defesa apresentada pelo policial rodoviário federal desde o início das apurações, a delegada afirmou que “legítima defesa é o que ele alega, nós entendemos que houve um homicídio doloso”. Os áudios das ligações feitas por Ricardo Moon ao Ciops revelam que ele pediu apoio de policiais de trânsito em razão de Adriano estar supostamente alcoolizado conduzindo a caminhonete. Na ligação, Moon solicita que bafômetro seja levado ao local.
Conforme a delegada, é possível ouvir Adriano contestando a atitude do policial. “Se eu vou fazer o teste, você também vai”. Alguns minutos depois, é possível ouvir Moon dizendo para as vítimas “vou mostrar, vou mostrar”. Para a polícia, é possível que o objeto que o PRF afirma que mostrará seja identificação de policial.
Na mesma gravação, o “Coreia” pede para que os ocupantes da caminhonete não deixem o veículo e ao pedir apoio para a Polícia Militar, ele afirma que “são três contra um”.
Outra conclusão da Polícia Civil com base nos horários das ligações feitas pelo policial rodoviário é que não houve perseguição. Segundo a delegada, do momento da batida da caminhonete no poste de iluminação até a ligação de Ricardo informando ter atirado contra o motorista, se passaram 1m16s. “É tempo muito extenso para alguém que está em perseguição”, analisou.
Sobre a apuração aberta pela Polícia Militar para investigar se os militares que chegaram no local favoreceram o PRF, a delegada afirmou que só é necessário uso de algemas quando o suspeito oferece resistência. “Quando não oferece, o uso é dispensável”, disse.
Para a Polícia Civil, se fossem usadas algemas para conduzir o policial até a delegacia, poderia ser considerado ato de abuso de autoridade. Sobre Ricardo Moon ter trocado de roupa entre o local do crime e a apresentação na delegacia, Kades afirmou que isso será apurado em sindicância da Polícia Militar.
Muitas dúvidas
Embora a Delegada Daniela Kades tenha concluído o inquérito policial sobre a morte do empresário Adriano Correia, que foi assassinado pelo policial rodoviário federal Ricardo Hyun Su Moon, algumas questões sobre o crime ainda permanecem sem resposta.
Uma coisa era certa: Ricardo Su Moon atirou para matar. Então a conclusão de que se tratava de um homicídio doloso é irrelevante, afinal o próprio PRF reconheceu isso, embora tenha dito que havia atirado para se defender, existe uma confusão sobre os motivos que o levaram a fazer isso. Inicialmente queria se proteger de um atropelamento cometido por um motorista embriagado, depois para se defender de uma possível ação do PCC.
Como se vê, a questão principal, não foi respondida. Qual a real motivação que levou Ricardo Su Moon a atirar diretamente contra o empresário Adriano Correia, causando sua morte?
Outro ponto que ficou sem resposta é a análise da alegação de legítima defesa feita pelo acusado. Não foi esclarecido se a intensidade da ação dele estava dentro do que seria a medida necessária para conter a suposta eminente agressão injusta.
O fato que motivou a prisão preventiva de Ricardo Su Moon, consistente na medida artificiosa de se apresentar espontaneamente na delegacia, mesmo depois de supostamente ter recebido voz de prisão de policiais militares, também não foi esclarecido. Na delegacia ele estava completamente uniformizado, com as vestes tradicionais da PRF. Mas nas imagens e vídeos gravados no momento da ocorrência é possível ver Ricardo Su Moon usando uma camiseta listrada, que prejudicava sua identificação visual como policial rodoviário.
A delegada Daniela Kades não se dedicou a esse detalhe. Conforme declarou em coletiva de imprensa, caberá à Polícia Militar esmiuçar esse fato em um procedimento autônomo, embora o inquérito policial tocado por ela seja o procedimento base para que o Ministério Público ofereça a denúncia contra o PRF por homicídio. Vários pontos cruciais ainda permanecem incertos, e a ausência dessas respostas pode deixar a denúncia com menos consistência.