Fraquezas de um tempo sombrio onde há apenas injustiça

Por: Ernesto Ferreira

 

Vós, que vireis na crista da maré
em que nos afogamos,
pensai,
quando falardes em nossas fraquezas,
também no tempo sombrio
a que vos escapastes.

Vínhamos nós então mudando de país mais do que de sapatos,
em meio às lutas de classes, desesperados,
enquanto apenas injustiça havia e revolta nenhuma.

E entretanto sabíamos:
também o ódio à baixeza
endurece as feições,
também a raiva contra a injustiça
torna mais rouca a voz. Ah, e nós,
nem pretendíamos preparar o terreno para a amizade,
nem bons amigos nós mesmos pudemos ser.
Mas vós, quando chegar a ocasião
de ser o homem um parceiro para o homem,
pensai em nós
com simpatia.
Trechos do poema “Aos que vão nascer”, de Bertolt Brecht, tradução de Geir Campos.

Escrevo com a sensação paradoxal de estar vivendo em tempos que me parecem sombrios como os que o poeta viveu, porém estranhamente, me sinto cheio de esperanças de que um país mais justo vá emergir, mesmo com todo o cinismo que empesteia o ar de nossa terra, para não falar dos velhos rancores que teimam em segregar um povo sofrido.

Por que me parecem tempos sombrios esses que se aproximam?

À eles, falta o sentido trágico que dá à nossa história, um significado fundador de uma verdadeira brasilidade, falta essa que, apenas permite existir em muitos de nós, um tipo de nacionalismo de aparência tosca, até mesmo monstruoso, falso em suas matrizes tanto psíquicas, quanto sociais e históricas, nascido mais da negação e da oposição ao outro, visto como inferior, estrangeiro, enfim “judeu” de algum modo, elemento esse a ser ser exorcizado e excomungado, em nome de um Deus sem amor, que autoriza inclusive, o ódio como modo de relação com esse outro.
Aristóteles, em sua Metafísica, já definia duas potências, a de ser e a de não ser. Nós, ainda não somos um povo, disso me convenço cada vez mais, talvez pela impotência de reconhecermos o valor de nossa trágica história, o que possibilitaria sua redenção no presente, permitindo que o sonho do poeta pudesse ter lugar aqui, entre nós.

Mas onde, então, está assentado o sentimento de esperança que me anima nesses tempos tão difíceis?

Precisamente aí, meu caro leitor, já me explico melhor, é que a potência de não ser pode ser e é, uma maneira sutil de potência, ela pode ser a potência de não sermos o que não queremos ser, assim é que podemos não aceitar nos transformarmos nesses patéticos fanáticos de um Apocalipse nativo, sem qualquer revelação transcendente que possa nos salvar.

Desse modo, será a recusa consciente à esse negativo de brasilidade (potência de não ser) que propiciará a nós cultivarmos a esperança, de um dia sermos um povo formado por homens e mulheres parceiros, dotados de um sentido de brasilidade maduro, construído sobre as nossas ruínas orgulhosamente expostas. acho, que assim poderemos almejar a simpatia dos brasileiros que ainda vão nascer.