Finalmente o corpo do arquiteto chinês Kongjian Yu, que morreu em um acidente aéreo ocorrido no dia 23 de setembro em Aquidauana (MS), no Pantanal de Mato Grosso do Sul, foi liberado para a família na quarta-feira (1°).
A entrega da declaração de óbito foi feita a representantes do Consulado da China no Brasil, na presença da esposa da vítima, Ji Qingping, e da filha, Yu Hope Hongmeng.
A esposa e a filha do arquiteto assinaram os documentos necessários para a conclusão dos trâmites formais no Instituto de Medicina e Odontologia Legal (IML), em Campo Grande (MS).
O corpo foi entregue à família para o velório e sepultamento, que deverão ser realizados em Pequim, na China. Os familiares não informaram detalhes do translado.
A demora de sete dias para liberar o corpo se deve a uma tradição chinesa que não permite a realização da autópsia para identificar as causas da morte, como determinam as leis brasileiras.
Na tradição chinesa, crenças culturais e religiosas respeitam a integridade do cadáver após a morte e a autópsia é vista como uma violação do corpo, considerado sagrado.
As autoridades brasileiras optaram pelo respeito à tradição cultural da família. Para conciliar tradição e cumprimento da lei foi necessária a intervenção da diplomacia dos dois países.
Os corpos das outras três vítimas — o piloto e proprietário da aeronave, Marcelo Pereira de Barros; o cineasta Luiz Fernando Feres da Cunha Ferraz; e o produtor e diretor Rubens Crispim Júnior — já haviam sido identificados e liberados anteriormente aos familiares.
Marcelo e Luiz Fernando foram identificados por exames de DNA. Rubens e Kongjian Yu foram reconhecidos por meio de exames necropapiloscópicos (confronto de impressões digitais).
Para comparar as impressões digitais, os legistas usaram dados do passaporte do arquiteto chinês arquivados no sistema do Federal Bureau of Investigation (FBI) nos Estados Unidos.
A Secretaria de Justiça e Segurança Pública (Sejusp0 do MS destacou que a colaboração do FBI foi essencial para confirmar a identidade do arquiteto e concluir o processo pericial com segurança.
Atendendo a um pedido dos familiares, não foram divulgados registros ou imagens do atendimento. “A Polícia Científica reafirma seu compromisso com a sociedade sul-mato-grossense na prestação de serviços periciais com responsabilidade, ética e celeridade. Reitera ainda sua solidariedade aos familiares e amigos das vítimas, brasileiras e estrangeiras, bem como o respeito aos representantes consulares envolvidos no processo”, disse, em nota.
Nascido na China em 1963, Kongjian Yu se tornou um prestigiado arquiteto e professor, mundialmente reconhecido pelos trabalhos e estudos sobre a contenção de enchentes, autor de livros e com projetos assinados em mais de 250 cidades ao redor do mundo.
Sua mais famosa criação é a noção de “cidades-esponja”, solução baseada na natureza para gerir a gestão de águas urbanas. Ele influenciou diretamente as políticas públicas na China, depois aplicadas em todo o planeta.
O urbanista estava no Pantanal, na companhia dos dois documentaristas brasileiros, para a gravação de cenas de um documentário voltado ao combate de enchentes e eventos climáticos extremos por meio da ampliação de áreas verdes e permeáveis. Ele via no ecossistema pantaneiro um modelo vivo de sua tese.
Yu veio ao Brasil para participar da Bienal Internacional de Arquitetura de São Paulo, organizada pelo Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB). Para as gravações no Pantanal, o grupo contratou o piloto e dono do avião, Marcelo Barros, que tinha grande conhecimento da região pantaneira.
A queda do avião Cessna 175, matrícula PT-BAN, fabricado em 1958, aconteceu ao lado da pista de pouso da Fazenda Barra Mansa, hotel turístico localizado na zona rural de Aquidauana. Segundo o Corpo de Bombeiros, o avião arremeteu durante o pouso e caiu durante uma manobra em curva. A aeronave explodiu ao bater no solo. Os corpos das quatro vítimas ficaram carbonizados.
Segundo a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), a aeronave estava autorizada apenas para voos diurnos – até às 17h39, mas o acidente aconteceu após as 18 horas. O avião havia sido apreendido em anos anteriores por realizar operações de táxi aéreo, para as quais não tinha autorização.
A aeronave foi liberada para voltar a voar em 2024. Um relatório preliminar do Centro Nacional de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) apontou que o avião teria batido em uma árvore durante a manobra de pouso e perdeu sustentação. A Polícia Civil abriu inquérito para investigar o acidente e aguarda a chegada de laudos complementares.