Com descaso da prefeita Adriane Lopes, médicos orientam pacientes a buscar Justiça

O descaso da prefeita de Campo Grande, Adriane Lopes (PP), com a saúde pública já atingiu uma proporção tão grande que os médicos do município estão orientando os pacientes a procurar a Justiça para garantir atendimento.

Conforme o site Campo Grande News, pressionados por pacientes e familiares, os próprios médicos têm orientado a judicialização como única saída para garantir atendimento, seja por uma vaga de internação, realização de exames ou até cirurgias de urgência.

A recomendação parece consequência de frustração dentro da classe médica, pela falta de planejamento do sistema público que transfere à Justiça o peso da saúde. Questionada sobre a previsão da transferência para uma paciente de 62 anos fazer exames complexos, a médica que terá a identidade preservada estimou uma semana.

“Já foi solicitada, mas você também pode pedir judicialmente. Se quiser, me procure amanhã à tarde para preencher uma ficha e entregar para você”, recomendou a médica para a paciente que estava no setor verde e medicada.

Ações judiciais pedindo transferência imediata para hospital e outras demandas de saúde geram sobrecarga à Justiça de Mato Grosso do Sul. Só os casos ajuizados pela Defensoria Pública Estadual cresceram 24% na comparação do primeiro semestre do ano passado com o deste ano, segundo dados repassados nesta semana à instituição.

O debate começou a ganhar força em 2023, quando o TJMS (Tribunal de Justiça do Estado) mobilizou o poder público e órgãos como a própria Defensoria para tentar reduzir os processos com matérias de saúde.

Além disso, porque chamam atenção desde o ano passado processos que pedem o bloqueio de valores expressivos em verbas públicas para tratar pacientes que não conseguem ser atendidos no SUS (Sistema Único de Saúde), seja quando o tratamento necessário não está disponível pela rede pública ou quando vaga não é liberada a tempo de a pessoa piorar e perder movimentos, por exemplo.

O CRMMS (Conselho Regional de Medicina de Mato Grosso do Sul) diz não ter recebido qualquer denúncia oficial sobre estímulo de médicos à judicialização. Vice-presidente da entidade, o médico psiquiatra Flávio Freitas Barbosa explica que, para avaliar se houve infração ética, é preciso ter um caso concreto em mãos e entender o quadro do paciente envolvido.

Ele reforça que o direito à saúde é constitucional, portanto, o paciente ou seu responsável têm a liberdade de recorrerem à Justiça e receber orientação. Esclarece ainda que o que cabe ao médico é “informar tudo sobre as condições reais do paciente a um familiar ou acompanhante, todo aspecto saúde física, a parte psicológica e a parte assistencial também, porque o médico também tem um papel social”.

A própria Sesau (Secretaria Municipal de Saúde) admite que o aconselhamento do médico ocorre, principalmente, na judicialização para conseguir procedimentos que o SUS não cobre, como órteses e próteses ortopédicas. Em casos assim é que o poder público pode ser obrigado pela Justiça a custear o tratamento na rede privada.

Eni Maria Sezerino Diniz, defensora coordenadora do Núcleo de Atenção à Saúde, explica que a judicialização sempre depende, em parte, da colaboração dos médicos, pois eles devem informar o quadro do paciente em uma ficha produzida pela própria Defensoria. Mas explica que nem todos os pedidos avançam porque existe um filtro do que seguirá à Justiça ou não.

A Defensoria tem uma ponte com técnicos do sistema de regulação de urgência e emergência da Capital que avaliam caso a caso e, segundo Eni, “são bem diretos” ao recomendar que o Poder Judiciário interfira e pressione pelo atendimento solicitado ou não. Até para não “passar na frente” de alguém que está em situação de saúde ainda mais delicada, complementa a defensora.

Presidente do Sinmed (Sindicato dos Médicos de Mato Grosso do Sul), o médico nefrologista Marcelo Silveira defende que se há influência dos profissionais na procura pela Justiça, é por “desespero”, com a intenção de ajudar e de tirar dos ombros uma pressão que deveria ser dirigida aos representantes políticos.

“Talvez num momento de desespero, tentando ajudar informalmente, ele fale com o paciente: ‘não está conseguindo, vai judicializar’. Porque ele não quer que aquele paciente fique ali, né? Ele quer que o paciente vá para a escala correta do atendimento. E ficar em UPA e CRS (Centro Regional de Saúde) esperando vaga, como tem acontecido, não está certo”, diz.

Ele afirma que médicos acabam sendo a “a cara do SUS” no dia a dia, quem o paciente ou familiar vê primeiro na hora de pedir auxílio e preservar a vida. Critica também a gestão da Saúde Municipal por não conseguir resolver a falta de leitos e adotar a política de manter pessoas nas UPAs e CRSs, o que não é adequado segundo normas técnicas.

A relação do médico paciente é muito íntima. E o médico quer resolver o problema do paciente e não consegue. Então, é uma situação de desespero pela falta de planejamento do gestor. Porque o gestor, se estivesse bem preparado, isso não aconteceria”, conclui.