Semana da Coffee Break tem André fujão, envolvidos mentindo e Olarte preso negando compra de cassação

A semana de oitivas do julgamento dos réus da Operação Coffee Break, que apura o esquema para a compra de vereadores para cassarem o mandato do ex-prefeito de Campo Grande, Alcides Bernal (PP), teve de tudo. Ela começou com o ex-governador André Puccinelli (MDB) conseguindo se livrar de prestar depoimento ao juiz David de Oliveira Gomes Filho, da 2ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos, empresários envolvidos mentindo ou usando a Covid-19 para não comparecer à audiência remota e terminou com o ex-prefeito da Capital, Gilmar Olarte (sem partido), negando envolvimento no esquema que o beneficiou.

Na terça-feira (18), dia que marcou o início dos depoimentos pelo juiz David de Oliveira Gomes Filho, o ex-governador André Puccinelli (MDB) vestiu a velha carapuça de “amarelão” e recorreu ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) para fugir em ser ouvido pelo magistrado. O italiano obteve uma liminar, às 22h10 de segunda-feira (17), para sentar no banco dos réus. Ofícios expedidos pelo STJ comunicaram a decisão ao TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul) e à 2ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos de Campo Grande.

Porém, o juiz David de Oliveira Gomes Filho decidiu mantê-lo como réu no processo que os demais acusados de tramar a cassação do ex-prefeito de Campo Grande, Alcides Bernal (PP), em troca de interesses particulares, e dispensou Puccinelli de prestar depoimento nos autos. Ao reconsiderar a decisão, o magistrado apontou a necessidade de replicar as mais de 18 mil páginas da ação civil em um novo processo apenas para André Puccinelli e o risco de ter que interrogar novamente todas as testemunhas que serão ouvidas neste processo, “quase uma centena”.

A mudança de posicionamento do magistrado também levou em consideração análise da decisão da ministra Assusete Magalhães, relatora do processo no STJ, que concedeu efeito suspensivo e livrou o ex-governador de sentar no banco dos réus. A ministra acolheu pedido da defesa de Puccinelli, que pediu a suspensão do depoimento até que seja julgado agravo interno pela 2ª Turma do STJ. O recurso diz respeito à tentativa da defesa de excluir o ex-governador da lista de réus na Coffee Break, o que foi determinado pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, em março de 2017. No entanto, o Ministério Público Estadual recorreu ao Superior Tribunal de Justiça, que aceitou o recurso em dezembro de 2018.

O MPE (Ministério Público Estadual) alega que há indícios suficientes “no sentido de que o Sr. André Puccinelli, então governador do Estado, teria atuado diretamente na cooptação dos vereadores que pudessem votar pela cassação do então prefeito Alcides Jesus Peralta Bernal, agindo de forma livre e consciente de que o fazia para que os edis e o grupo empresarial referido obtivessem vantagens ilícita”. A ministra Assusete Magalhães deu provimento ao recurso especial para que a ação civil volte a tramitar em primeiro grau. Diante disso, a defesa de André Puccinelli entrou com o agravo interno para tentar reverter a decisão da ministra. Este recurso se arrasta desde maio de 2019 no STJ, quando foi pautado inicialmente e, posteriormente, adiado. Novas datas foram marcadas para 1º de outubro de 2019 e 27 de abril de 2021, que também foram adiados.

Com isso, a ministra relatora dos recursos especiais decidiu suspender o depoimento de Puccinelli de terça-feira (18), que abriria a maratona de audiências que marcam o histórico julgamento da Operação Coffee Break, suspenso em março do ano passado por causa da pandemia da covid-19. Diante da decisão da ministra do STJ, o juiz David de Oliveira Gomes Filho, inicialmente determinou o desmembramento do processo em relação a André Puccinelli.

Vereadores

Depois da “fuga” de André Puccinelli, na quarta-feira (19) e na quinta-feira (20), foram às vezes de vereadores de Campo Grande, que não conseguiram explicar ao juiz David de Oliveira Gomes Filho, a relação com o empresário João Morim. Eles insistiram que a cassação do ex-prefeito Alcides Bernal foi resultado de atuação política, mas não conseguiram explicar ou se contradisseram sobre os diálogos telefônicos interceptados pela Polícia Federal entre eles e João Amorim, suspeito de ser sócio oculto da Solurb.

O empresário João Alberto Krampe Amorim dos Santos, dono da Proteco Construções Ltda., é apontado como um dos articuladores do esquema “regado a cafezinho” que cassou o mandato do então prefeito de Campo Grande. A sócia do empresário, Elza Cristina de Araújo dos Santos, teve várias ligações interceptadas em que chama os parlamentares para o “cafezinho”. Para o Gaeco, o termo significava propina.

Durante o interrogatório comandado pelo magistrado, os vereadores são confrontados por gravações que demonstram Amorim com uma ingerência “muito grande” sobre os parlamentares durante o processo de cassação. Diante disso, os depoentes acabam dando respostas “evasivas”, e dizem que atendiam o dono da Proteco apenas como um empresário como qualquer outro.

Chama a atenção dos investigadores, porém, a frequência das ligações entre Amorim e os parlamentares, e também a intimidade demonstrada nas gravações, nas quais o empresário se convida ou diz estar a caminho para ir à casa de alguns vereadores. Outros questionamentos feitos durante o interrogatório dizem respeito a esclarecimento de dúvidas, como as ligações para “combinar o cafezinho” e o que era tratado nestes momentos, outro ponto bastante contraditório, já que os investigados dizem que tratavam de negociações particulares, como compra e venda de gado.

Nessas mesmas datas, a investigação descobriu depósitos de altos valores na conta dos negociadores, sem comprovação formal do negócio ou justificativa para o montante. Um dos interrogados chegou a dizer que o dinheiro era fruto de empréstimo com parente. Foram ouvidos os ex-vereadores Mário César (MDB), Flávio César (PSDB e atual secretário-adjunto do Estado de Governo), Airton Saraiva (DEM), e Waldecy Batista, o Chocolate; e os vereadores Gilmar Nery da Cruz (Republicanos) e Carlos Augusto Borges, o Carlão (PSB), atual presidente da Câmara, que fazem parte da atual legislatura da Câmara Municipal de Campo Grande.

Também foram ouvidos o empresário Carlos Eduardo Naegele, dono do Midiamax; os autores do pedido de impeachment, Raimundo Nonato, e o advogado Luiz Pedro Guimarães; e André Luiz Scaff, ex-secretário municipal. Os dois últimos também foram confrontados com áudios do processo. A defesa do empresário Carlos Naegele tentou usar a mesma manobra para beneficiá-lo, mas o STJ recusou o pedido, porque o dono do Midiamax já estava sendo ouvido pelo juiz David de Oliveira Gomes Filho, conforme despacho da ministra Assusete Magalhães. A defesa do empresário João Amorim ingressou com pedido para suspender o depoimento da ex-vereadora Luiza Ribeiro (PT) no julgamento.

Os advogados solicitaram que o juiz considerasse o depoimento prestado pela ex-vereadora na ação criminal, que teria sido realizado no dia 28 de novembro de 2019. O vídeo com o depoimento, feito em sigilo, foi juntado ao processo de improbidade administrativa. A justificativa era de que isso aceleraria o processo. O MPE (Ministério Público Estadual) se opôs ao pedido, pois também arrolou a petista como testemunha e que são outros fatos e tem interesse em questioná-la pessoalmente. O juiz David de Oliveira Gomes Filho negou o pedido da defesa de Amorim.

Covid-19

 A pandemia do novo coronavírus (Covid-19) foi a desculpa dada pelo empresário João Baird para explicar a ausência em sessão judicial realizada em continuidade dos depoimentos de réus da Operação Coffee Break, que investiga suposto esquema para cassar o ex-prefeito de Campo Grande, Alcides Bernal (PP), em 2013. Ele informou por meio da defesa estar isolado na fazenda de sua propriedade por causa do risco de contrair Convid-19 e, por isso, não participou da sessão, apesar de o procedimento ter sido realizado por videoconferência. João Baird é dono da Itel Informática, empresa que tinha contratos com a Prefeitura de Campo Grande, e figura no polo passivo da ação.

Coube então ao empresário João Amorim, que também é acusado de participar do esquema, ser o único ouvido na audiência e, diante das perguntas e de exposições de áudios que indicariam sua participação em tratativas para “comprar” a cassação de Alcides Bernal na Câmara de Vereadores, respondeu sempre em tom de negativa. Ele também foi indagado sobre diálogos com vereadores, nos quais receberia “prestação de contas” sobre o andamento do processo para retirar Bernal do cargo, de acordo com a denúncia da promotoria.

“É muito simples, a minha empresa sempre foi, há muito tempo, uma das empresas de determinado porte aqui no Estado. E é muito comum, vários vereadores querem falar com nossos funcionários. E a gente sempre abriu para os vereadores irem lá falar suas propostas”, afirmou João Amorim, dono da Proteco Engenharia. “Eu devo ter feito vários telefonemas para saber como estavam as coisas a título de saber como estavam as coisas”, garantiu. O juiz David de Oliveira Lima interrogou João Amorim sobre possíveis encontros com o ex-prefeito Gilmar Olarte, que assumiu a vaga de Bernal, pois era vice-prefeito na chapa.

O empresário assegurou que elas só ocorreram depois que Olarte estava na função de prefeito. No interrogatório, o magistrado quis saber dos áudios de telefonemas em que a expressão “tomar um cafezinho”, é lida pela acusação como disfarce para combinar o pagamento de propinas. Amorim negou. Disse que chamar as pessoas para tomar um café, um tereré, é rotina na vida das pessoas.

Gilmar Olarte

Encerrando a primeira semana, na sexta-feira (21), o ex-prefeito Gilmar Olarte negou que fosse o “Goiano”. Preso, ele prestou depoimento da prisão, onde cumpre condenação de outra ação. Por aproximadamente uma hora e vinte minutos, Gilmar Olarte foi ouvido pelo juiz David de Oliveira Gomes Filho e pelos promotores de Justiça Humberto Lapa Ferri e Adriano Lobo.

Basicamente, Olarte negou todas as acusações de ter participado de esquema para cassar o mandato do então prefeito de quem era vice, Alcides Bernal (PP), defendeu todas as escolhas que fez na prefeitura, afirmando que foram de cunho técnico e não uma troca de cargos por votos na cassação.

Admitindo ter se preparado para assumir o cargo quando ‘burburinhos’ de impeachment começaram a acontecer, ele negou ter feito acertos políticos em troca de votos contra Bernal, mas assumiu que houve conversas, já que ele precisava rapidamente fazer a transição e fazer a prefeitura ‘andar’.

“Acerto político, não. Conversas sempre há. Isso aconteceu com Temer, Itamar. Vice tem obrigação de se preparar”, revelou à Oliveira Filho, sem explicar a diferença entre conversas e acertos, apesar de ser indagado sobre tal posteriormente.

Quanto à indicação de vereadores para secretarias, ele destaca que não houve “no sentido pejorativo”, mas usou como exemplo a pasta de Educação, tradicionalmente gerenciada pelo PSDB, partido o qual ele afirma ter conversado para que fosse usado a experiência de seus quadros em sua gestão.

Compra de votos – Já quando questionado sobre sua relação com os empresários João Amorim e João Baird, acusados de financiar o processo de cassação, Olarte negou relação próxima com ambos e que apenas com Amorim chegou a conversar trivialidades, em conversa na casa do empresário quando ainda era vice.

Além disso, durante todo depoimento o ex-prefeito negou ter participado ou saber do envolvimento dos citados na cassação de Bernal – e assim ele não esteve envolvido em nenhuma ‘compra de votos’ para que pudesse assumir o posto.

Outra negativa de Olarte foi quando a uma suposta ‘ponte’ que o empresário Fábio Machinsky faria entre ele e Baird. “Ele não fazia. Baird tinha contratos com a prefeitura, e eu inclusive não assinei novos”, respondeu, confirmando depois que conhecia Machinsky, também chamado de Fabão.

Negando ter se encontrado com João Amorim – mas se contradizendo posteriormente, onde disse que foi até sua casa já que várias pessoas queriam saber o perfil de Olarte quando ainda era vice – o ex-prefeito se mostrou bastante incomodado com a suposição de que ele seria a pessoa atribuída a Goiano.

“Ninguém nunca me chamou de Goiano. Tem alguma ligação de alguém me chamando de Goiano? Então não procede. Outro réu falou? Eles estão induzindo”, se defendeu. Em outra oportunidade, ele ainda debochou da pergunta feita.

Questionado sobre se tinha conhecimento de transferência de valores entre Baird e Amorim entre 2013 e 2014, ele respondeu que “como vou saber? Não tem como eu saber envios empresa à empresa”, rindo durante e após a fala.

Quando colocado áudio em que ele conversa com o então secretário de Saúde, Jamal Salém, afirmando que a gestão deveria ser dividida entre os dois, conforme combinado anteriormente, Olarte precisou ser mais específico na explicação e depositou tal ‘acordo’ a conversas partidárias.

“Essa conversa foi feita de forma partidária já durante o mandato, para que alinhassem as coisas e atendessem bem a população. Quando falei que o combinado era tocar juntos, estava querendo dizer que não estavam me agradando e eu queria colocar o dedo ali, queria participar para melhorar”, concluiu.

Posteriormente, Olarte se disse orgulhoso das indicações para chefiar as pastas municipal que realizou e que todos eram quadros com experiência e capacidade para tal. Outro assunto tratado no depoimento foi Ronan Feitosa e sua participação na cassação de Bernal e no pagamento de dívidas de campanha. “Ele disse que o Bernal tinha [dívidas de campanha] e por isso estaria trocando cheques”, comentou Olarte, se referindo ao depoimento feito por Ronan.

“As pessoas viajam. Qual o poder de um assessor para negociar cargos e nomear pessoas”, completou Olarte, dizendo que não procedem as afirmações que ele pagaria seus credores assim que assumisse o comando da prefeitura – já que, segundo ele, suas dívidas eram normais, de dia a dia, nada exorbitante.