Os erros”crassos” que Classe Média vem cometendo

Por: Ernesto Ferreira

Segundo Thomas Piketty as classes médias só apareceram no cenário mundial no século XX, visto que a distribuição das rendas nacionais no final do século XIX e mesmo no início do XX, não permitiam que segmentos mais qualificados das classes baixas pudessem desfrutar de rendas que os colocassem no patamar que consideramos ser o das classes médias atuais. Para deixar claro isso, ele utilizou-se de tabelas de desigualdade de rendas, que mostram, por exemplo, que em 1910 (Século XX!), na gloriosa Europa, que mais adiante seria o cenário do mas bem sucedido contrato social entre ricos e pobres, hoje seriamente ameaçado, os 10% mais ricos detinham 90% do total das rendas (a esse grupo ele denomina “classes superiores”) e, dentre eles, o 1% mais rico(classes dominantes), detinha impressionantes 50% dessas rendas; os 40% do meio (classes médias), detinham muito pouco, apenas 5%, enquanto os 50% mais pobres(classes populares), ficavam com fatia igual à essa, mostrando que praticamente não fazia diferença ser do meio da pirâmide populacional ou da parte de baixo, da base.

Portanto, pode-se sem exageros, afirmar que em 1910, não havia verdadeiras classes médias na Europa. À essa perversa desigualdade, Piketty denominou educadamente “desigualdade muito acentuada” e, ilustra numericamente uma situação de “desigualdade suave”, que nunca foi observada: os 10% mais ricos deveriam ficar com 30% das rendas totais, o 1% com 10%,  os 40% do meio com 45% e os 50% mais pobres com 25%. Notem, caros leitores, que ele escreve ” desigualdade suave”, evita, portanto falar em “igualdade”, talvez por uma atitude cética consciente, visto que nunca houve sequer uma sociedade com um grau de desigualdade tolerável, nem mesmo as dos países escandinavos dos anos 70/80, que ele denominou como de “desigualdade média”.
Bom, deve estar o curioso leitor se perguntando o que tudo isso tem a ver com o título desse texto, ” o erro da classe média”, obviamente brasileira no particular. parte do título é uma homenagem pessoal ao grande pensador brasileiro Joaquim Nabuco, que escreveu o belo artigo ” o erro do Imperador”, em que descrevia como Dom Pedro II, ao nomear um gabinete conservador, provocou sua própria deposição, visto que a proclamação da República em nosso país, ocorreu às avessas, feita que foi pelas classes dominantes, o 1% dono de algo desconhecido de nossas rendas, provavelmente muito mais que os 50% dos seus congêneres europeus e, parte pela adesão da maioria das classes médias tupiniquins à aliança conservadora que domina o país, atitude que considero um erro semelhante ao do Imperador, visto que as políticas adotadas até agora apontam para o aumento da desigualdade, mesmo que possam eventualmente, conduzir a economia à algum crescimento, o que já não será fácil, de qualquer modo.
Para defender meu argumento, vou utilizar alguns dados do orçamento da união: algo próximo de 40% dele vai para pagar os serviços da dívida pública e, pasmem, 85% dela pertence à apenas 0,3% da população brasileira, três milésimos, uma cabeça de alfinete num palheiro, incrédulo leitor. Agora, compare com o quanto é destinado à saúde, algo como 4,1%, à educação,  3,1% e à assistência social, 2,7%. Como você já deve estar intuindo, como a PEC (Projeto de Emenda Constitucional) 241, enviada ao Congresso Nacional pelo atual Guwoverno, exclui da limitação de gastos, o pagamento dos serviços da dívida, que provavelmente aumentará a sua fatia relativa e até absoluta do orçamento público, dá para vislumbrar o que acontecerá com as rendas auferidas pelas classes médias, quedas inexoráveis e contínuas, pois uma das formas de transferências de rendas públicas de renda para elas se dá por meio dos gastos diretos do orçamento da união com os serviços de Saúde, Educação e Previdência Social, em que os maiores beneficiários são indivíduos desses segmentos sociais. É claro que os maiores afetados serão os mais pobres, mas até isso atingirá as classes médias negativamente, pois essas realizam comércio e prestam serviços à todos que pertencem às camadas populares.
Essa crítica à posição política da maioria das pessoas das classes médias, é um chamamento à uma reflexão sobre as idéias e projetos ora propostos no nosso país, pois acredito que na importância desse segmento na construção de um  país desenvolvido e mais justo. No próximo texto, abordarei o papel político que vislumbro para as classes médias, a partir da concepção de Giorgio Agamben. até lá.

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