Afundamento do PT em MS: Enquanto Zeca vai responder processos sem foro, Vander se safou

O que parecia impossível há alguns anos, agora é praticamente inevitável: o afundamento do PT em Mato Grosso do Sul. No Estado onde o partido governou por oito anos, agora a sua principal liderança, o deputado federal Zeca do PT, foi derrotado na disputa por uma vaga no Senado Federal para uma ilustre desconhecida, Soraya Thronicke (PSL), por uma diferença de quase 80 mil votos – o petista fez 294.059 votos, enquanto a “soldado” do fenômeno Jair Bolsonaro atingiu 373.712 votos.

Porém, pior do que não ser eleito senador, é o fato de Zeca do PT perder o foro privilegiado nas investigações da Lava Jato. Agora, os processos contra ele que hoje tramitam no STF (Supremo Tribunal Federal) devem ser enviados para análise na 1ª instância. Zeca foi citado em duas delações premiadas da Lava Jato – da Odebrecht e da JBS. No início do mês, a procuradora-geral da República Raquel Dodge encaminhou ao STF pedido de arquivamento de um dos inquéritos contra ex-governador de Mato Grosso do Sul por falta de provas.

Tal investigação tinha como base as delações dos ex-executivos da Odebrecht. Zeca do PT, que comandou o Estado de 1999 a 2006, foi acusado de receber propina da empreiteira em 2006. Zeca aparecia na lista da empreiteira, que prestou serviços para o governo, com o codinome “pescador” e pagamento de R$ 400 mil, conforme apuração da revista Veja. Em maio do ano passado, os irmãos Wesley e Joesley Batista – donos da J&F, controladora da JBS – delataram centenas de políticos que teriam recebido propina da empresa e revelaram que em Mato Grosso do Sul, o esquema foi instituído pelo então chefe do Executivo em 2003.

Wesley contou, conforme consta na transcrição do depoimento do empresário anexada ao acordo de colaboração premiada firmado com a PGR, que foi Zeca quem negociou percentual de 20% do valor economizado em ICMS (Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços) pela empresa em Mato Grosso do Sul como propina. Os valores supostamente pagos ao então governador não foram informados. O dono da JBS e Valdir Boni, um dos executivos da empresa, acrescentaram, entretanto, que em 2010 voltaram a fazer pagamentos a Zeca do PT, quando ele se candidatou a deputado federal.

Os delatores disseram que R$ 3 milhões (R$ 1 milhão em doação oficial e R$ 2 milhões em espécie) foram pagos ao então candidato e relataram ainda que por ordem de Joesley, Florisvaldo Caetano de Oliveira fez pagamentos da ordem de R$ 100 mil ao deputado. Numa das ocasiões, Zeca teria buscado remessa de dinheiro pessoalmente em escritório de São Paulo (SP). O parlamentar de MS é investigado por recebimento de vantagens indevidas e lavagem de dinheiro em trâmite no STF, mas teve pouco avanço em um ano e meio. Outros processos contra o deputado, acusações que ficaram conhecidas como “farra da publicidade”, também tramitam no Supremo.

 

“Efeito Lava Jato”

O “efeito Lava Jato” tirou muita gente do Congresso Nacional. De 64 candidatos a deputado e senador com processos em curso ligados à Lava Jato ou decorrentes dela, 35 não foram eleitos. Entre os envolvidos na operação que têm contas a acertar com a Justiça, restaram 4 senadores e 25 deputados federais eleitos. Um deles é Vander Loubet (PT-MS), que volta para a Câmara dos Deputados, em 2019, mantendo o foro privilegiado.

Em abril deste ano, a Procuradoria-Geral da República (PGR) denunciou o deputado federal reeleito Vander Loubet por “caixa 3” nas eleições de 2010. A acusação é que a doação de R$ 50 mil registrada oficialmente na campanha eleitoral do deputado como sendo feita pelas empresas Praiamar e Leyroz – ligadas ao Grupo Petrópolis, dona de marcas como a cerveja Itaipava – foi feita na verdade pelo Grupo Odebrecht.

Essa é a segunda denúncia oferecida ao Supremo pela PGR em inquéritos abertos com base nas delações de executivos e ex-executivos da Odebrecht – mas é, no entanto, a primeira pelo crime de falsidade ideológica eleitoral, que tem pena prevista de 1 a 5 anos de prisão, além de multa. Segundo os investigadores, a Odebrecht usou as empresas Praiamar e Leyroz como intermediárias para doar ao deputado petista de forma a burlar os mecanismos oficiais de registro e controle da lisura do processo eleitoral – a afirmação é que Vander Loubet tinha consciência das irregularidades.

A referência a “caixa 3” existe tanto no relatório final da PGR quanto no documento em que a Procuradoria apresenta a denúncia. A diferença para o caixa 2 é que este pressupõe uma doação não contabilizada. Além de Vander Loubet, foram denunciados os ex-executivos do Grupo Odebrecht e colaboradores premiados Alexandrino de Salles Ramos de Alencar e Benedicto Barbosa da Silva Júnior. Também foram denunciados os donos da Cervejaria Petrópolis, Walter Faria, e das empresas Praiamar e da Leyroz, Roberto Lopes. A estes últimos, no entanto, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, recomendou a suspensão condicional do processo.

Na denúncia, a procuradora-geral afirma que o deputado petista não foi o único beneficiado pelo modelo de doação via “caixa 3” instituído pela Odebrecht. “O mesmo modus operandi de doações foi adotado pela Odebrecht/Grupo Petrópolis/Leyroz e Praiamar em diversos outros casos” enfatizou Dodge. Ela citou outros quatro inquéritos em tramitação no Supremo, que têm como alvos os deputados Carlos Zarattini (PT-SP), Heráclito Fortes (DEM-PI) e Mário Sílvio Negromonte Júnior (PP-BA) e a senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM).

Loubet já é réu no Supremo em inquérito relacionado à Operação Lava Jato. Em 14 de março de 2017, a Corte recebeu a denúncia apresentada pelo ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot, que acusou o deputado de ter recebido pagamentos de propina que chegariam a um total de R$ 1,028 milhão em esquema de corrupção na BR Distribuidora entre 2012 e 2014. Ele se tornou o primeiro parlamentar réu na Lava Jato pelo crime de organização criminosa. Loubet também responderá pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.